terça-feira, 13 de setembro de 2011

DONA GERMÂNIA



Curvada,

Com um cabo de vassoura de bengala,

Esfomeada,

Em farrapos.

Catadora de papel aposentada,

Meio salário mínimo                                  (a lei mudou depois)

Sai do último quarto do cortiço,

De mil cruzeiros de aluguel

Rumo a Santa Casa...

Para contar mil dores,

Dores por todo corpo,

Tentando passar sete dias

[o que permite o INAMPS]

Com cama, banho e comida.



Chega ao médico e chora

-Doutor: Dói-me o peito.

-E a cabeça?

-Dói também... e a coluna...o pé..

-Mas que falta de ar que estou.

Sorri o Doutor

Já a conhece

Compreende e a interna...

Lá chega Dona Germânia contente,

Na familiar enfermaria.

-São sete dias!



No último quarto do cortiço

Continua dormindo seu filho,

Quarenta e cinco anos,

Sobre um montão de trapos velhos

E mil ratos co-habitantes.

Neste barraco dois por dois,

Com uma garrafa de pinga

Espera,

A volta da mãe de setenta anos.

É aleijado,

Mas não demonstra revolta.



Sai ano... entra ano...

Há mais de cinco anos

Na mesma ladainha.

Está tudo bem.

Mas um dia:

Vão demolir o cortiço!

Recusam-se a sair.

O juiz manda

O asilo arruma vaga.

O filho aleijado é levado...

Na marra...

E dona Germânia?

Fugiu com seus trapos.

A policia monta guarda

Para cumprir o mandado.

Mas aonde?

Na porta da Santa Casa.

Foi capturada,

Levada ao asilo,

Com cama, banho e comida,

Mas resta a dúvida:

Não vai Dona Germânia fugir?



20/04/1984

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