terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

O PERU





Ganhei um enorme peru. Estava vivo e aí começou uma história. Era época de Páscoa e o Sr. João, pequeno chacareiro de Nóbrega, distrito de Marília, com todo carinho, por um ano tratou a ave só com milho. Era meu presente de Páscoa, hábito da época de presentear o médico, com leitão ou frango, mas devidamente abatidos.

O paciente era do ambulatório da Santa Casa e tinha Lepra. Naquele tempo ainda não se falava hanseníase; que veio para quebrar o estigma da doença. Realmente provocava rejeição. A enfermagem, composta por atendentes formadas pelas freiras, não havia nem auxiliar, morriam de medo do doente. A transmissão já estava controlada, mas a dor intensa nos casos graves apresentava grande dificuldade de controle e tratamento.

Creio que, o fato de atendê-lo prontamente, todas as vezes que necessitou tenha proporcionado a gratidão, era um presente oneroso para ele. Foi esta ave tratada só com milho por um ano.

Morava numa casa com amplo quintal. Soltei a ave. Conversando com o Dr. Turato, colega de consultório e criado em fazenda, fui alertado que o dito animal bica tudo que é brilhante. Novo problema. Meus filhos Rodrigo e Érico de cinco e três anos eram da altura do peru. Portanto os olhos estavam na altura da ave. Ana e eu ficamos com medo.

A casa tinha um corredor lateral de iluminação e ventilação de quartos e cozinha. Perto de quatro metros de comprimento. Vedei com toda precaução a entrada deste local, o peru não teria acesso aos olhos, e lá coloquei o meu presente.

O peru teria que ser preparado. Ana e eu crescemos na capital, nunca tínhamos comido ou preparado ou lidado com tal animal. Não saberíamos e não teríamos coragem de matá-lo. Era muito grande, não cabia no nosso forno.

Assim que o ganhamos convidamos o grupo de amigos e ainda, Dr Cardeal que tinha me apresentado e apadrinhado na Santa Casa e Dr. Simão que havia me cedido o consultório e, ainda transferido alguns doentes, sem cobrar nada; para que me fixasse na cidade. Era a oportunidade de demonstrar minha gratidão.

Estávamos em abril, coincidia meu aniversário, o aniversário de casamento e a Páscoa. Fomos procurar quem faria tal prato. Depois de muito perguntar Ana encontrou uma velha senhora na Nova Marília, local que ainda estava abrindo, longe de tudo. Combinou e trouxe a lista de ingredientes.

Como o Super Mercado Pastorinho era o melhor, os demais estavam no começo, para lá me dirigi e nunca gastei tanto para uma festa. Não havia a fartura de hoje e os preços eram altos. Comprei os ingredientes, as bebidas e tudo que era necessário. O Peru seria à Califórnia. Tinha duas farofas, coisa que nunca soube. Fora as compotas e frutas e passas e assim por diante.

Dia marcado Ana foi à Nova Marília buscar a iguaria. A senhora se enganara com o dia, tinha feito o prato no dia anterior e já estava quase o comendo para não estragar, segundo ela. Voltou o Peru ao forno. Chegou no horário.

Todos elogiaram, cheguei até experimentar uma fatia de peito. Mas, depois de ver a beleza e imponência da ave cheguei à conclusão que é melhor que viva solta, sem ser imolada por nossos caprichos culinários. Nunca mais comi Peru.





28/02/12

tony-poeta pensamentos




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