sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

QUEM É O CULPADO: O MÉDICO, O DOENTE OU A DOENÇA?






QUEM É O CULPADO: O MÉDICO, O DOENTE OU A DOENÇA?





Cada vez encontro mais dificuldade na relação médico paciente. Exercendo a profissão há trinta e seis anos, com hábito, ou até vício de leitura, com especialização em psicossomática e geriatria, que tem como base a relação médico-paciente; vejo a dificuldade crescendo ano a ano. Percebo que meus colegas mais jovens apresentam problema semelhante e, na maioria das vezes partem para especializações, cada vez mais restritas para atenuar o problema. Como conseqüência o paciente acaba ficando dividido em partes. As partes, por sua vez, se subdividem continuamente e aumentam o número de especialistas.

Como conseqüência: começam a faltar médicos generalistas. Médicos e pacientes ficam cada vez mais desorientados. Este ciclo ao invés de se completar aumenta em espiral, sem solução visível.

Numa análise sucinta podemos notar três pontos de realce, que ajudariam entender a situação ora apresentada.

O primeiro refere-se ao médico. Temos a medicina dividida em estatizada, [com toda justeza], e o modelo de medicina empresarial, representada por convênios. Estes fatores acarretaram que o custo começasse a ter destaque em toda formação médica. O que vai se prolongar pelo exercício da profissão. Esta influencia em crescente chegou a um ponto que a tornou o fator mais importante da saúde. Como exemplo, copiarei um artigo [peguei alheatoriamente, é dirigido a médicos e apoio ao paciente. Não citarei o livro ou o autor, pois o artigo está inserido na forma correta, ou que se pensa correto, ao abordar uma doença]. Dia o texto: “A depressão esta associada a altos custos sociais e financeiros. Em 1990, o custo anual com a depressão foi de U$ 44 bilhões; desse, U$ 24 bilhões (55%) representaram custos indiretos pela perda de produtividade, em função do maior número de faltas ao trabalho e pela redução na eficiência profissional.” E por aí vai. Este padrão, presente em todos os artigos, ocupa vários parágrafos da matéria, quantia muito superior ao sofrimento do paciente, se este sofrimento não for omitido, por não haver métodos de mensuração.

Ora, um médico que em sua formação teve esta preocupação desde que viu o primeiro doente e a primeira doença, com toda certeza terá uma visão distorcida. No seu trabalho certamente se confundirá entre o fator econômico e doença; dois elementos totalmente incompatíveis. Este assunto daria uma discussão prolongada que não cabe nesta observação.

Em segundo lugar, temos as novas descobertas, nem sempre aplicáveis de imediato. Com a facilidade de informações atuais, e sua ampla divulgação, ira afetar diretamente o imaginário de um leigo.

É comum, o paciente já vir à consulta pedindo uma tomografia do corpo todo; para ver

se é portador de câncer. Ou se não poderia usar a célula tronco, para tratar sua hipertensão, e outras ricas fantasias imaginárias. Esta desorientação o deixa justamente inseguro e o faz procurar médicos cada vez mais especializados, nem sempre disponíveis e necessários. Temos uma verdadeira maratona a Clínicas e Hospitais.

Em terceiro lugar, a imprensa e provavelmente as seguradoras de saúde, começaram a transferir ao doente a responsabilidade total de sua saúde. Vemos nos meios de imprensa, o que, e o que não se pode comer; quanto, e como este ou aquele alimento é benéfico ou prejudicial. Estive observando o que aconteceu com o ovo.

 O exame de colesterol é muito recente. Temos na sua elevação um maior risco de derrame e infarto do miocárdio, devendo para isso ser controlado, junto com outros fatores de risco: tabagismo, obesidade, sedentarismo, estresse entre outros. Não se constitui propriamente numa doença. Não tem sintomas. No inicio da pesquisa do colesterol, que ainda não está concluída, começou a se procurar um culpado. O primeiro foi o ovo. Numa história digna de romance e, sem se chegar a uma conclusão definitiva: O ovo foi proibido; liberado de uma a três vezes por semana; recomendado todo dia, ou com liberdade para ser consumido. É o que está valendo atualmente. É evidente que uma pessoa normal fique completamente perdida. Se procurar o seu médico, este concordará com a última pesquisa. Ou seja, igual à imprensa.

Em outra observação na Inglaterra, para agravar mais a balbúrdia existente, começou um movimento, no qual o médico tem de discutir com o paciente a medicação prescrita. Numa infecção o paciente vai escolher o antibiótico mais adequado. Isto já está valendo no nosso país com concordância das Associações Médicas. O doente ficou totalmente responsabilizado.

Resumindo: Não há mais doentes e sim doenças. A responsabilidade é toda do paciente e o médico, administra o custo econômico do tratamento em relação à volta ao trabalho, ou as aulas se forem pediatra. Todos perderam lugar na medicina.

 A medicina é definida; “como o bem estar físico, mental e social de individuo” e deve ser atribuição do médico, juntamente com os profissionais auxiliares, para manter a saúde integral da população. A função do paciente é se dirigir ao médico, informar seus sintomas, receber e seguir as orientações proposta e sua responsabilidade acaba aí. A parte monetária só será discutida, se as posses do paciente não permitirem a compra do medicamento, cabendo ao médico procurar uma solução satisfatória.

O que temos hoje é muitas filas, pois quanto mais especialistas maiores o numero de consultas por uma única pessoa. Insatisfação justa, de todos os implicados médicos, auxiliares e pacientes, pois houve quebra da hierarquia.  E o mais grave, o ser humano tem um imaginário mágico. O médico além de técnico tem que ter uma função de “feiticeiro” e se comunicar com estes medos imaginários, fazendo-os fugir. [daí o sacerdócio] A medicina tem que ter ritual.

 Além de responsabilizar o doente de sua própria patologia, tiram-lhe o ritual de exorcização e colocaram o médico e o pessoal da saúde como meros espectadores, sem função claramente definida. É lastimável a insensibilidade da área cientifica. A saúde como um todo tem que reencontrar sua hierarquia. Cada um ocupar um lugar determinado; logicamente usufruindo dos benefícios da pesquisa. Quem pesquisa não vê gente.   



tony-poeta pensamentos

03/02/2012


















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