sábado, 10 de março de 2012

A MIJADA DO LACAN


A MIJADA DO LACAN







Os hábitos urinários de um cão macho são de difícil controle. Lacan nos deu algum trabalho, em parte devido nossa inexperiência. Nunca tivemos cão dentro de casa. Mas, contornamos o problema e ele só urina no jornal que colocamos, ou próximo dele. Parece que o conceito de local, para ele, é mais amplo que o nosso. Quanto às fezes, só a faz na rua em local com grama e mato.

Portanto, acabou por ser bem administrada  as necessidades, salvo quando nos visitam seus “primos” os Yorkshire do Rodrigo e do Carlos. Parece que os três comandam o rim e produzem urina ininterruptamente, marcando, remarcando, marcando de novo o território. São todos machos. Para desespero das mulheres que sobem as cortinas, tiram objetos do chão e tomam todas as precauções, sempre infrutíferas.

Como a Ana viajou, fiquei só eu e ele em casa.

Damo-nos muito bem, eu tento entendê-lo e ele faz o mesmo comigo. Creio até que leve uma certa vantagem, pois enquanto me distraio no telefone, leitura e computador ele tem todo tempo para me observar, o que só deixa de fazer quando está dormindo. Para ele a sesta é sagrada. Tanto é que a noite, na hora dele dormir, fica insistentemente lambendo minha perna. Não gosta de dormir só e sempre pede companhia a alguém próximo. Como aprendeu que, dando uma lambida vou verificar o que ele necessita, uma das linguagens que usa é esta. Um tanto molhada, mas eficiente. Sempre dá certo.

O fato de estar só, a moça que nos ajuda só vem de dia, dá a liberdade de usar o banheiro e as demais dependências do pequeno apartamento de portas abertas. Ficar sozinho, preso, com a porta emperrada não deve ser nada agradável.

Notei que Lacan, que acompanha tudo atenta e presentemente, ficava olhando minha urinada. Até aí tudo bem, me esforçava para não respingar fora do vaso.

É interessante notar que já vi piadas de respingos da urina em todas as línguas, sempre com charges engraçadas. Portanto a falta de pontaria deve ser um problema Universal. Para isto adaptei meu esquema. Como é proibido passar o Piso de Banheiro nas gotas excedentes; quando só, levo um pano de chão ao banheiro; coloco um frasco do cheiro escolhido pela esposa ao lado. Não pode ser qualquer Pinho. Ela diz que fica cheirando banheiro de Rodoviária. A vida toda passei os dias trabalhando, o banheiro doméstico só usei a noite por todos estes anos, para mim cheiro de banheiro é cheiro de pinho. Mas, tudo bem, compro o cheiro escolhido. E se houver algum erro de pontaria, passo o pano, ponho algumas gotas de cheiro, sempre erro e sai bastante, mas não vem ao caso, repasso o pano e está tudo cheirando nos conformes.

Como dizia, Lacan observava atentamente. Certo dia notei uma mancha grande de urina no pé do vaso. Era uma boa quantidade. Verifiquei se tinha feito corretamente a higiene local após meu uso, estava tudo certo. Limpei, coloquei o cheirador. Após algum tempo, de novo. Como não tivesse ido ao banheiro era o Lacan. De olhar aprendeu.

Realmente começou a urinar ao pé do vaso. Aguçou minha imaginação. Fiz várias hipóteses: Podia estar competindo pelo domínio do território. Li que os cães e outros mamíferos marcam a posse do território por urinadas; ou então que seria um mecanismo de submissão, aonde iria a meu território e se declararia subalterno, menos provável. Poderia também, e esta sim me deixou pensativo, que tivesse aprendido que o lugar de urinar era ali, como já tinha feito com as fezes; Seria fantástico. Continuei a análise, comprei mais cheiro e sacos alvejados para definir melhor o processo cientifico.

Ana chegou. Não lhe falei nada. Deixei que observasse por si. Foi rápida a observação:

-Não chega você, e agora o cachorro mija fora do vaso! Exclamou.

Achei a atitude não cientifica, lembrei-me de Sócrates que teve que expulsar Xantipa sua esposa, antes de tomar a cicuta, pois ela estava se escabelando, sem manter a classe antes da morte. Expliquei que a observação era importante para avaliar o raciocínio canino. Que não tinha relatos nos livros de etologia, argumentei, argumentei em vão, Xantipa continuava a se escabelar. Determinou que a porta do banheiro permanecesse fechada.

Fui obrigado a obedecer. Lacan entendeu voltou ao jornal, nem de birra mijou na porta do lavatório. Agora conservo a porta fechada, com receio que a não obediência provoque a compra de uma enorme argola, onde a chave será colocada e pendurada na cabeceira da cama, e para usar o banheiro terei que pedir ordens. Do jeito que acontece nas repartições públicas.





10/03/12

tony-poeta pensamentos






Nenhum comentário:

Postar um comentário