quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

O VELÓRIO


O VELÓRIO


 

 

Era considerado muito seguro, não gastava dinheiro com nada, mas... Sonhou que morreria em uma semana.

João de Souza, assim era seu nome, acreditou no sonho.

- Foi muito real, dizia, meu pai veio e falou francamente como falava quando era pequeno.

Sentiu-se só e sem amigos. Ficou com medo que ninguém o velasse. Resolveu preparar o velório.

Contratou o conjunto do Zeca para animar, afinal era seu primo e não tinha emprestado dinheiro para que ele comprasse o violão.

- Vamos ver se me perdoa, pensou, não imaginava que tinha talento e faria sucesso na nossa cidade.

Chamou o buffet da Mariazinha com quem não quis casar.

- Pelo menos assim ela vai me ver, pensou. Quase que tive cinco filhos, ainda bem que foi com o Paulinho. Que despezão!

Chamou o pessoal do boteco do Raimundo, aonde nunca ia para não gastar, e o time de futebol da cidade.

- Vamos ver se assim me perdoam de não participar das vaquinhas da compra de camisas e das bolas. Até me proibiram de ver o jogo, pensava. Depois perdoaram, mas ninguém batia papo. Nunca perdi um jogo. Eles deviam ficar contentes com o torcedor. Com a festa eles vão, ah, se vão!

- Quem mais quiser, pode ir, afinal não quero morrer sozinho.

Comprou o caixão, o mais barato:

- Vai estragar em baixo da terra, para que gastar, pensou.

Pagou adiantado o velório e a cova, a última do cemitério:

- Que gasto bobo, ninguém vai gastar vela comigo.

Deitou na véspera esperando a chegada da morte.

Acordou, estava vivo,

- Pode ser durante o dia que vai ter o desfecho, meu pai não mentiria, pensava, mas sentia-se muito bem.

Meia noite: estava vivo, o sonho não se realizou:

- Meu finado pai é um mentiroso, gastei meu dinheiro à toa! Repetia indignado.

 

05/12/12

Tony-poeta

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