O
VELÓRIO
Era considerado muito seguro, não gastava dinheiro com nada,
mas... Sonhou que morreria em uma semana.
João de Souza, assim era seu nome, acreditou no sonho.
- Foi muito real, dizia, meu pai veio e falou francamente como
falava quando era pequeno.
Sentiu-se só e sem amigos. Ficou com medo que ninguém o velasse.
Resolveu preparar o velório.
Contratou o conjunto do Zeca para animar, afinal era seu primo e
não tinha emprestado dinheiro para que ele comprasse o violão.
- Vamos ver se me perdoa, pensou, não imaginava que tinha
talento e faria sucesso na nossa cidade.
Chamou o buffet da Mariazinha com quem não quis casar.
- Pelo menos assim ela vai me ver, pensou. Quase que tive cinco
filhos, ainda bem que foi com o Paulinho. Que despezão!
Chamou o pessoal do boteco do Raimundo, aonde nunca ia para não
gastar, e o time de futebol da cidade.
- Vamos ver se assim me perdoam de não participar das vaquinhas
da compra de camisas e das bolas. Até me proibiram de ver o jogo, pensava.
Depois perdoaram, mas ninguém batia papo. Nunca perdi um jogo. Eles deviam
ficar contentes com o torcedor. Com a festa eles vão, ah, se vão!
- Quem mais quiser, pode ir, afinal não quero morrer sozinho.
Comprou o caixão, o mais barato:
- Vai estragar em baixo da terra, para que gastar, pensou.
Pagou adiantado o velório e a cova, a última do cemitério:
- Que gasto bobo, ninguém vai gastar vela comigo.
Deitou na véspera esperando a chegada da morte.
Acordou, estava vivo,
- Pode ser durante o dia que vai ter o desfecho, meu pai não
mentiria, pensava, mas sentia-se muito bem.
Meia noite: estava vivo, o sonho não se realizou:
- Meu finado pai é um mentiroso, gastei meu dinheiro à toa!
Repetia indignado.
05/12/12
Tony-poeta
Maravilhoso desempenho para João de souza.
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