sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

INDIVIDUALISMO E MORTE


INDIVIDUALISMO E MORTE


 

Hoje uma coisa me chamou atenção enquanto lia um artigo sobre Roma antiga, a maneira que eles enfrentavam a morte.  Realmente, completamente diferente de hoje; pelo menos nos relatos históricos.

Certa vez um amigo, professor Universitário [já falecido] de grande cultura veio me procurar. Pedia ele que fosse a um velório, uma vez que a família estava desconfiada que o defunto não houvesse morrido. Tinham colocado um espelhinho nas narinas e acreditavam que este ficou embaçado.  Perguntei mais detalhes antes de uma visita desagradável e inútil, até que ele me informou, quando perguntei de que tinha morrido este senhor, que o mesmo morrera de infarto do miocárdio, conforme constava da autópsia.

Expliquei-lhe que após uma autópsia evidentemente o homem estava morto. Isto ocorreu há vinte anos chamou-me atenção, mas era esporádico. Nos últimos anos que cliniquei em Prontos Socorros e Hospitais a inconformidade se generalizou. Por mais que fosse evidente que o paciente não tinha mais nada a ser feito, a família sempre procurava uma explicação à morte, ora culpando o próprio doente, ora o cuidador, ora a equipe médica, ora os exames subsidiários, mas na maioria dos casos, sempre a procura de um “culpado” por esta morte, a qual achava “não natural”.

Realmente a ciência apresentou grande avanço e, a vida média aumentou muito fazendo com que a morte ficasse menos presente na vida da sociedade, felizmente. Porém esta não aceitação da morte, processo natural de todos os seres vivos necessita uma análise mais acurada.

Com a organização de grupos de humanos, a presença de um líder, a quem eram atribuídos poderes “sobrenaturais” como, descendente de Deus, o poder mágico, poder de ver o futuro, ou seja, o poder do Oráculo; a pequena sociedade que nele se apoiava ficava a mercê de sua vontade em todos os pontos, incluindo a morte, que ele a decidia conforme seu entendimento.

Com uma organização maior, a vida ficou na dependência de hierarquias, o pai aceitava ou não o filho; caso não fosse aceito era morto ou abandonado, como Édipo ou Moisés, para que morresse, pois não estava socialmente aceito.  Portanto a vida passou a pertencer à sociedade em si, e se estendia a todas as camadas, incluindo o Governante Maior.

Estava criada uma hierarquia de vida. Além da natureza com seu tempo incerto, o dominante determinava a vida do dominado. Este podia ser morto, mandado para guerra, vendido como escravo ou mercenário, enfim o que aprouvesse o senhor. Este por sua vez, no jogo de poder, vivia entre os assassinatos por armas ou envenenamentos, sendo sempre a disputa de morte.

Pós a sangrenta 2ª Guerra Mundial, com a descoberta dos antibióticos e os progressos científicos que a guerra propiciou, a Medicina começou a ter melhores resultados para a manutenção prolongada da vida.

A sociedade por sua vez começou a apresentar autonomia, não se submetendo a mandatários, bem como as leis para assassinatos ficaram rigorosas, incluindo os praticados pelo próprio estado.

A religião perdeu força e a prepotência passou a fazer parte de cada um.

O homem livre de suas mazelas começou a se sentir ele mesmo imortal e, o seu Deus passou a ser a ciência. Se alguém morreu houve falha, pois a “divindade ciência” não falha.

Esta ausência de um controle superior da vida, própria do ser humano, e consequentemente da parte social está provocando uma desagregação; a sociedade que conhecemos está morrendo. Temos atualmente um mundo individual onde a agregação é frágil e restrita a grupos muito pequenos, isolados e autônomos. O avanço da Ciência, o enfraquecimento de um poder politico, e o vazio religioso estão provocando uma desorganização social, onde predomina o individualismo e os laços afetivos tornam-se fracos, quase ausentes.

Creio que esta fase é transitória para nova forma de sociedade, ainda a se formar, uma vez que a ciência anda em saltos e se estabiliza a seguir, onde os avanços tornar-se-ão lentos e um poder “superior” será invocado como medida extrema ao desamparo que se estabelece, é só aguardar um tempo não mensurável.

Enquanto isto a marginalidade nas populações mais frágeis, o financiamento do crime nos grupos de maior poder e a desagregação familiar se faz sentir e deve se agravar atingindo a sociedade como um todo.

Só nos resta aguardar o novo equilíbrio, que espero que seja breve.

 

01/02/13

Tony-poeta

 

 

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