sábado, 25 de maio de 2013

PRESENÇA AUSENTE.



 

PRESENÇA AUSENTE.


Quem é esta sombra que no dia a dia vigia meus passos? A quem me refiro quando breco o carro para não atropelar um cachorro, que atravessa a estrada deserta onde sou único condutor naquela hora?  A quem me espelho quando busco aplausos ou críticas, e aciono em todas as horas do dia, e quem sabe nos sonhos, mesmo naqueles que teria vergonha de contar a mim mesmo? Quem é este ausente que me acompanha?
Não! Não estou tendo um delírio psicótico, nem formulando absurdos para confundir, não estou viajando na arte da poesia para um desfecho de amor beijando a amada, estou falando sério: todos nós temos a presença deste ausente.
Não estou me referindo a um deus onipresente, mesmo que por muito tempo a humanidade confundiu esta presença com ele; mas o deus religioso é um deus místico e este é um deus comum do dia a dia, que está presente antes e depois do encontro da amada; na paz e na guerra,
Quando criança pequena convivi com ele, cheguei a conversar e dar-lhe imagem, nome e atividade; é o amiguinho ou a amiguinha, que para desespero dos meus pais que temiam um distúrbio no jovem infante, olhavam atônitos sem saber o que fazer.
Como o torcedor que vi meu time de futebol ser campão e voltando sozinho do estádio conversava animadamente com um ser oculto; fui o namorado apaixonado que acabou de perder a amada, que sai pelas ruas me recriminando, blasfemando e xingando a amada que não me entendeu.
Aqueles que chamamos doentes mentais conversam geralmente apavorados com o presente ausente e podem criar as cenas mais inusitadas e perigosas. Uma vez passado o que acreditamos ser surto, [por não entender nada,] são os que mais sofrem com esta presença incomoda, com medo que sociedade o submeta a outro tratamento.
A psicanalise afirma que todos os humanos tem este acompanhante sendo normal nos referirmos a ele.
O infante ao nascer, na hora que abre os olhos para o mundo estranho, agressivo e totalmente desconhecido, tem medo, muito medo, este mundo se introjeta e escraviza instantaneamente.
Este é o eterno acompanhante. É ele que direcionará tudo o que fazemos, é nosso modelo e orientador, por ele criamos nossa cultura, nossa língua, nossa gramática, nossas relações sociais, nosso país. Ele é que faz o pai ter orgulho de mandar um filho a guerra, sabendo que este não vai voltar. Que faz um jovem enfrentar um tanque de guerra com meia dúzia de pedregulhos. Por ele o amante sacrifica até a vida pela amada e coisas incríveis acontecem. É esta primeira impressão que chamamos Simbólico, que além de conversarmos com ela, tentamos imitá-la e ser igual a ela no delírio supremo de pertencer ao Universo. Este simbólico é a nossa definição de autoestima e é a sociedade que nos acolhe.
Ao me re-conhecer  no mundo e interioriza-lo este se tornará o modelo que defenderei até com a própria vida, para tanto fantasio e tento ficar igualitário a ele, Imagino que minhas ações esta igual ao original, este simbólico que criei na visão de iniciante. Converso com ele, eu apenas uma cópia; quero a perfeição do modelo; sofrendo pelas distorções, sempre procurando a igualdade que será o gozo total.
Oras, é um jogo tentar enquadrar o que imagino com o que simbolizo; é como ter um papel com um furo, nele cabe o que falta no outro desenho imaginário e tento a distancia, com todos os elementos se movendo, fazer que um complemente o outro e formar a imagem mágica que me trará a felicidade completa.
 Como coxo, minhas pernas claudicam ao andar, o homem é um ser que falta o apoio, se não houver outro humano, só lhe resta falar com o ausente. Na presença de outro é onde crio a amizade e o amor, convivo, junto com eles tento enquadrar as imaginações no simbolismo, mas o que cada um imagina é diferente, mesmo o simbólico varia por serem distorções do olhar, e com apoio de amigos e na procura do amor e até da paixão os claudicantes andam apoiados buscando a harmonia e a paz duradoura.
Os amigos sempre perduram, mas no amor e na paixão a busca pela felicidade, onde encaixe do imaginário com o real é intensa, às vezes no sexo e gozo chega-se perto, mas efêmera a experiência não se repete e, tudo volta ao campo da amizade ou fenece definitivamente.
Sou ser simbólico, tudo que faço gira em torno dele, a autonomia que imagino ter é insignificante, sou guiado pela refração viciada dos primeiros dias de existência. Sou uma gota d’agua que se julga o oceano e converso com ele, às vezes tentando mostrar minha grandeza.

25/05/13
Tony-poeta


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