sexta-feira, 19 de setembro de 2014

LEONOR, A PATINADORA GORDA - CONTO -

LEONOR, A PATINADORA GORDA.


Romualdo foi conversar com o Gerente do Hipermercado do Sul, Leonor moradora do núcleo, onde ele vereador tinha grande votação a ponto de manter sua reeleição, queria a vaga de patinadora.
As patinadoras eram a novidade daquele grande Mercado vindo do Sul, onde mocinhas sobre patins orientavam os compradores, agilizavam os caixas, sempre deslizando elegantemente com seu corpo de manequim e a camiseta escrita: Estou para ajudar.
O grande problema é que Leonor, uma pessoa adorável, comunicativa e alegre, cujo sonho de infância foi ser patinadora artística, era gorda e alta. Nada parecido com alguém que praticasse tal esporte; mesmo assim patinava com a mesma desenvoltura que as magricelas que lá trabalhavam.
O político foi conversar com Julio, o gerente. Era uma pessoa jovem de boa conversa que tomava umas cervejas com as funcionárias após o expediente, como era costume local e ainda era de confiança do proprietário, Sr. Hans.
 Explicou a demanda de sua afilhada:
-Mas é gorda, falou Julio, todas são magras.
-Mas, anda de patins melhor que elas e é muito agradável e inteligente.
- Sei não! Respondeu Júlio, não animado, se o Sr. Hans mandar eu coloco.
Para instalar o Hipermercado na cidade, Hans representando um grupo de empresários interessados na região, e sabendo da concorrência de Grandes Grupos da área, fez acordos que não são imagináveis com o prefeito, o Gervásio. O vereador saiu desconsolado.
Dia seguinte, em uma coincidência que Romualdo não acreditou como tal, já que conhecia o prefeito, foi chamado para uma conversa no Gabinete.
Entrou na sala do prefeito, sentia-se estranho, raramente ia aquele covil de negócios escusos, mas além dos votos que tinha que manter admirava muito Leonor e faria o possível para ajudá-la.
- Que bom que você veio, falou o Edil. Vou fazer uma proposta que interessa a nós dois. Pode estar certo que é um bom negócio para a cidade, como por cinco mandatos você faz questão de exigir.
- O que me propõe? Falou o vereador.
- Quero asfaltar a Avenida que vai para o Brejão, é este o nome do Bairro de Leonor, vou colocar linha de ônibus para ajudar o pessoal e ela vai até a pracinha, onde moram seus eleitores.
- Sim, acenou Romualdo.
- Para isto preciso da aprovação da Câmara, tem umas desapropriações que são obrigatórias, senão não sai nada. Veja o projeto, e o Prefeito abriu um mapa, com os documentos para liberar a verba do Estado. Tudo normal. Romualdo olhou e examinou papel por papel.
- Realmente é de grande valia, por fim falou.
- Você vota? Indagou o prefeito.
- Conforme esta demonstração, sim.
- Ótimo. Falou a Prefeito com cara de triunfo.
- Sabe Gervásio, ali mora Leonor, é gordinha e quero arrumar um emprego de patinadora no Hipermercado, é uma moça excelente.
- Patinadora? E o prefeito começou a rir...
- Sim, ela patina desde criancinha, é uma das melhores.
- Par demonstrar boa vontade, já que você demonstrou comigo, vou telefonar pro Hans. - Nicinha liga pro Hans, falou para secretária.
Logo a seguir...
- Hans, tenho um pedido estranho. Quero que você contrate uma patinadora gorda.
- Ótimo, à noite tomamos um wisque. Mandarei, sim! Pronto, dirigindo-se ao Romualdo, mande a moça falar com o Julio amanhã cedo. Está contratada.
- Mandarei, sim! Obrigado.
- O que, que é isto, uma mão lava a outra.
O vereador saiu desconfiado, mas... Tudo bem.

A CONTRATAÇÃO

Leonor após ser avisada que o emprego era seu. Dirigiu-se ao Supermercado. Foi direto falar com o Júlio. Este já a esperava. Olhou-a de cima a baixo, coçou o queixo. Falou:
- Conforme o prometido, o emprego é seu. Vai até Dona Alzira fazer o uniforme. Qual o número de patins que você calça?
- Quarenta e cinco, respondeu a moça. Sabe sou muito grande e os pés acompanham.
- Onde você comprou patins deste número?
- Mandei fazer de encomenda em São Paulo, não existe pronto.
- Demorou quanto tempo?
- Três meses, mas valeu a pena, nem os sinto em meus pés.
- Dá então o endereço para que eu mande fazer...
- Demora muito, posso usar os meus?
- Tenho que falar com Neuza do Recursos Humanos, me aguarde.
Meia hora depois.
- A Dona Neusa falou que é norma da Instituição não aceitar empréstimos. Temos que mandar fazer.
- A cidade está esburacada, retrucou Leonor, não estou conseguindo patinar. E se fizer a doação dos patins em troca do emprego?
- Não sei! Pegou no telefone:
- Neusa, sou eu de novo, se a moça doar os patins.
- Certo! Vamos ver se assim ajeita.
- Leonor, se doar os patins, você começa a trabalhar assim que o uniforme ficar pronto, mas os patins ficam da empresa.
- Não faz mal, eu quero trabalhar com eles, não importa o dono.
- Então está acertado, falou Júlio.
- Sim, retrucou sorridente e feliz a moça.

O TRABALHO

De início aquela moça gorda e grande chamou muita atenção de clientes e funcionários. Virou motivo de comentários
Leonor porém era muito doce, gentil, atenciosa. Agradava todo mundo.
Com o tempo todos cliente se dirigiam a exótica funcionária. Além de se destacar pelo tamanho, não deixava de atender desde a mais simples demanda até o mais complicado problema. Era um destaque,
Como tudo que se destaca provoca inveja, esta começou aos poucos.
De início as outras patinadoras que ironizavam apenas o tamanho da nossa patinadora, começaram a procurar novos defeitos e criar inverdades para ver se provocavam constrangimentos a mesma, tudo em vão.
A central de boatos e maldades foi ampliada até o gerente que começou a ficar incomodado com a boa penetração da moça na clientela;
- Logo me mandam embora e o emprego fica com ela, falava,
Leonor não se abalava, fazia seu serviço sem se importar com as fofocas. Estava sempre feliz.

A CAMARA.

Romualdo chegou excitado no dia da votação da avenida. O prefeito o tinha enganado. O partido conseguira o mapa real que fora enviado ao Governo do Estado e, ao invés de beneficiar a comunidade, esta seria desapropriada, jogada na sarjeta, como costuma acontecer nos acertos da política.
Mostrou de um por um de seus colegas o absurdo e, justificava assim sua mudança de posição.
A sessão foi tumultuada, insultos, que normalmente ocorrem nessas ocasiões se excederam. A sessão foi suspensa por três vezes para acalmar os ânimos.
Finalmente e avenida foi rejeitada por um voto. O prefeito perdeu graças ao vereador da oposição.
Ninguém lembrou de Leonor.

O DESFECHO

Gervásio ficou furioso com a derrota, falou todos os tipos de palavrões que conhecia e até inventou alguns novos. Este filho de uma puta de vereadorzinho me paga.
Alguém lembrou de Leonor, que endossava o voto.
- É Rua! falou o prefeito.
- Coitada! Falou Mirtes, a secretária, não tem nada ligado a política, trabalha com gosto e até Dona Maria, sua esposa gosta dela.
- É verdade. Falou o prefeito, pobre moça na mão deste canalha, traidor. Mas Política é política e trato é trato. Liga para o Hans.
- Sei que é boa funcionária, seu Hans, falou o prefeito, mas Romualdo não cumpriu o trato, tem que pagar.
- Certo seu Hans, também sinto muito, assim é a vida.
No outro dia Júlio, junto com as outras patinadoras e funcionários invejosos comemoravam.
Leonor foi embora sem seus patins, os olhos lacrimejavam.

19/09/14
Tony-poeta







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