FRIO NAS PERNAS É PSICOLÓGICO.
Uma das lembranças não agradáveis de minha infância são as
benditas calças curtas. Nasci e cresci em São Paulo, na época havia ainda a garoa,
[hoje ela se mudou não sei para onde] fazia frio, muito frio. “Como criança não tem frio nas pernas”, enfrentava
o frio com as mesmas descobertas, apenas uma meia um pouco mais longa.
Lembro-me que num ano muito frio meu pai comprou na Rua Direita
uma calça Bombacha. Era uma calça de lã cinza, parecia de cobertor, sendo
amarrada nas canelas. Realmente aquecia.
Fui contente para escola; peguei o ônibus na Av. Brigadeiro Luiz
Antônio com a Rua dos Bombeiros para descer na Avenida Paulista. Uma viagem
curta, menos de dez quadras, mas de uma subida muito íngreme. Mal entrei e um
passageiro falou:- um gaúcho. Naquela época as pessoas eram mais espontâneas e
se comunicavam publicamente, o que me deixou preocupado era se gaúcho era
elogio ou depreciação. Como o frio era intenso deixei de lado a defesa da
masculinidade e usei tal roupa naquele inverno.
Vim a usar a calça comprida no segundo semestre do primeiro
ginasial, juro que fui o último a ter tal peça de roupa. Nas férias tio Dante
mandou fazer duas calças caqui na costureira em Araraquara, tendo como modelo
as calças do Carlinhos, meu primo da mesma idade. Recordo-me que entrei
triunfante no Ginásio.
Hoje redimi meu progenitor, explico: - As mulheres usavam
vestido e saia, calça comprida as deixava “faladas”. Aliás, o difícil
da mulher naquele tempo era não “ficar falada”; se era enfermeira, artista,
trabalhava fora, saia e demorava em voltar já era motivo.
Todas tinham as pernas descobertas, se bem que existia uma
proteção: a meia fina. Naquele tempo tal meia era importada, comprava-se e
juntamente tinha que adquirir um vidro de esmalte para reparar os desfiados. A
meia era tão fina que desfiava a qualquer contato. Tinha mais um detalhe, era
importada, muito cara. A época no País era de vacas magras, tudo era difícil.
O preço acessível e o uso cotidiano lembro-me bem, só veio a
acontecer uns seis anos depois, onde meu pai na compra de mês adquiria duas ou três
unidades na recém-aberta loja do Pão de Açúcar na Av. Brigadeiro. Não era só eu
que estava passando frio, minha mãe e Marizilda, minha irmã também.
Pensando bem, acho que este negócio de frio nas penas é psicológico.
11/08/2013
Tony-poeta
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