quarta-feira, 23 de maio de 2012

O ACERTO DE CONTAS


O ACERTO DE CONTAS




João estava injuriado, Clarice quase todo dia falava que Marcelo chegara com papo estranho do lado dela. Eram todos do mesmo grupo de adolescentes e os dois namoravam há três meses.

Ele, filho de japoneses imigrados já adolescentes, que mal falavam o português, era quieto e inseguro. Não frequentava muito a colônia japonesa, pois crescera em uma região só de brasileiros, deste modo ficava deslocado nos dois lugares, tanto com os Nisseis como com o pessoal local. Isto fazia com que ele fosse quieto e introspectivo.

Clarice, não ficava atrás em termos de insegurança, sempre fora insegura, isto fazia com que ela medisse obsessivamente o amor que lhe era dispensada, exatamente a atenção que achava que João não fazia, Certa vez leu que se despertasse ciúme o namorado este daria mais atenção. Suas amigas concordaram.

 Marcelo, que fazia cursinho para engenharia e estudava junto com João era falador e galanteador. Com seus um metro e oitenta e, físico atlético fazia tudo para aparecer mais que seu tamanho. Foi o escolhido como o terceiro que despertaria o tal ciúme, e se falasse que a roupa estava bonita, imediatamente dizia para João:

- Ele falou que sou muito bonita. Na ideia dela seu namorado ia se desmanchar em carinhos pelo ciúme despertado.

O mirabolante plano estava dando efeito contrario: se por um lado João ficava com ciúme e raiva, por outro não entendia como Marcelo, que estudavam juntos, que os pais dele gostavam que andasse com João, pois este forçava o grandão a estudar, e até seus pais gostavam dele, ficava atentando sua namorada.  Isto o deixava mais calado e menos carinhoso.

Com a proximidade do vestibular a coisa piorou. Neste ano de 74 houve a unificação de vestibulares das faculdades escolhidas. Aumentou a concorrência, que já era grande, João sabendo as dificuldades da família, estudava com mais afinco, já que seria difícil fazer mais um ano de cursinho.

Clarice, por sua vez, certa que não estava preparada para passar no exame, queria toda atenção, o que não conseguia. De inicio pensou que era por não ser Nissei, os pais de João demoraram em aceitar o namoro. Até pensou que era pelo vestibular. Conversou com suas amigas.

Expos o problema, fizeram mil e uma considerações que as adolescentes costumam fazer, e por fim sua amiga Darlene, a mesma que tinha sugerido o ciúme, falou:

- Você tem que testar se realmente ele te ama. Aumenta bastante o ciúme dele, aumenta mais o que Rogerio falou e daí ele vai cair de carinhos. Senão é que ele não gosta de você e daí é hora de cair fora.

Clarice hesitou em adotar esta politica de choque, afinal gostava de João e tinha medo de levar um fora. Por outro lado todas suas amigas concordaram com Darlene, e ela, mais confusa ficou pensando em como fazer.

Quando foi a São Paulo fazer a inscrição, junto com sua mãe fizeram algumas compras na Rua Direita. Com ela foi ao cursinho, era uma blusinha azul que havia comprado. Era um modelo moderno, dava para notar que não era roupa habitual da cidade. Rogerio, como sempre extrovertido brincou:

- Blusa nova, hein! Está muito bonita. E foi embora.

A noite contou para João que Rogerio falou que ela estava atraente. João ficou super nervoso. Levou-a para casa às nove e meia, não as dez como era o costume deles e da cidade. Mal falou com os pais de Clarice e foi para casa. Estava com pressa. Tinha visto o Rogério tomando cerveja com os amigos.

Foi até o armário e pegou o revolver. Era uma Mauser alemã, relíquia de coleção, que estava guardada para custear seus estudos. Valia oito mil. João sabia atirar com ela, pelo menos ele achava. Deu cinco tiros quando visitaram o tio Yoshi. Ia dar uma dura no Rogerio e se precisasse metia bala.

Com o rosto frio, sem denotar nenhuma expressão, pediu a seu pai para sair. Com a Kombi, carro de entregas da família, que por ser de sustento ficava guardado, sempre se andava a pé. Foi pro barzinho. Rogerio ainda tomava cerveja.

Sentou a mesa e foi falando:

- Você esta cantando minha namorada. Vai se explicar e cair fora, senão eu estou armado... E mostrou a arma com a mão esquerda.

- É uma Mauser alemã de guerra. Meu pai que comprar uma, está pagando doze mil. Falou entusiasmado Rogério, que não estava entendendo nada.

João pensou na faculdade, na dificuldade de estudar, pediu uma cerveja, entegou a arma e começaram a combinar o pagamento.



23/05/2012


















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