PRESENÇA AUSENTE.
Quem é esta sombra
que no dia a dia vigia meus passos? A quem me refiro quando breco o carro para
não atropelar um cachorro, que atravessa a estrada deserta onde sou único
condutor naquela hora? A quem me espelho
quando busco aplausos ou críticas, e aciono em todas as horas do dia, e quem
sabe nos sonhos, mesmo naqueles que teria vergonha de contar a mim mesmo? Quem
é este ausente que me acompanha?
Não! Não estou tendo
um delírio psicótico, nem formulando absurdos para confundir, não estou
viajando na arte da poesia para um desfecho de amor beijando a amada, estou
falando sério: todos nós temos a presença deste ausente.
Não estou me
referindo a um deus onipresente, mesmo que por muito tempo a humanidade
confundiu esta presença com ele; mas o deus religioso é um deus místico e este
é um deus comum do dia a dia, que está presente antes e depois do encontro da
amada; na paz e na guerra,
Quando criança
pequena convivi com ele, cheguei a conversar e dar-lhe imagem, nome e atividade;
é o amiguinho ou a amiguinha, que para desespero dos meus pais que temiam um
distúrbio no jovem infante, olhavam atônitos sem saber o que fazer.
Como o torcedor que
vi meu time de futebol ser campão e voltando sozinho do estádio conversava animadamente
com um ser oculto; fui o namorado apaixonado que acabou de perder a amada, que
sai pelas ruas me recriminando, blasfemando e xingando a amada que não me
entendeu.
Aqueles que chamamos
doentes mentais conversam geralmente apavorados com o presente ausente e podem
criar as cenas mais inusitadas e perigosas. Uma vez passado o que acreditamos ser
surto, [por não entender nada,] são os que mais sofrem com esta presença
incomoda, com medo que sociedade o submeta a outro tratamento.
A psicanalise afirma
que todos os humanos tem este acompanhante sendo normal nos referirmos a ele.
O infante ao nascer,
na hora que abre os olhos para o mundo estranho, agressivo e totalmente
desconhecido, tem medo, muito medo, este mundo se introjeta e escraviza
instantaneamente.
Este é o eterno
acompanhante. É ele que direcionará tudo o que fazemos, é nosso modelo e
orientador, por ele criamos nossa cultura, nossa língua, nossa gramática,
nossas relações sociais, nosso país. Ele é que faz o pai ter orgulho de mandar
um filho a guerra, sabendo que este não vai voltar. Que faz um jovem enfrentar
um tanque de guerra com meia dúzia de pedregulhos. Por ele o amante sacrifica
até a vida pela amada e coisas incríveis acontecem. É esta primeira impressão
que chamamos Simbólico, que além de conversarmos com ela, tentamos imitá-la e
ser igual a ela no delírio supremo de pertencer ao Universo. Este simbólico é a
nossa definição de autoestima e é a sociedade que nos acolhe.
Ao me re-conhecer no mundo e interioriza-lo este se tornará o
modelo que defenderei até com a própria vida, para tanto fantasio e tento ficar
igualitário a ele, Imagino que minhas ações esta igual ao original, este
simbólico que criei na visão de iniciante. Converso com ele, eu apenas uma
cópia; quero a perfeição do modelo; sofrendo pelas distorções, sempre
procurando a igualdade que será o gozo total.
Oras, é um jogo tentar
enquadrar o que imagino com o que simbolizo; é como ter um papel com um furo,
nele cabe o que falta no outro desenho imaginário e tento a distancia, com
todos os elementos se movendo, fazer que um complemente o outro e formar a
imagem mágica que me trará a felicidade completa.
Como coxo, minhas pernas claudicam ao andar, o
homem é um ser que falta o apoio, se não houver outro humano, só lhe resta falar
com o ausente. Na presença de outro é onde crio a amizade e o amor, convivo,
junto com eles tento enquadrar as imaginações no simbolismo, mas o que cada um
imagina é diferente, mesmo o simbólico varia por serem distorções do olhar, e
com apoio de amigos e na procura do amor e até da paixão os claudicantes andam
apoiados buscando a harmonia e a paz duradoura.
Os amigos sempre
perduram, mas no amor e na paixão a busca pela felicidade, onde encaixe do
imaginário com o real é intensa, às vezes no sexo e gozo chega-se perto, mas efêmera
a experiência não se repete e, tudo volta ao campo da amizade ou fenece definitivamente.
Sou ser simbólico,
tudo que faço gira em torno dele, a autonomia que imagino ter é insignificante,
sou guiado pela refração viciada dos primeiros dias de existência. Sou uma gota
d’agua que se julga o oceano e converso com ele, às vezes tentando mostrar
minha grandeza.
25/05/13
Tony-poeta
Nenhum comentário:
Postar um comentário