ESTRUPICIA, A DOMÉSTICA.
Certa vez
minha mãe ganhou de presente uma empregada. Dona Deia sempre foi especialista
em arrumar pessoas estranhas para trabalhar, mas esta era dada. Coisa inédita,
e não tinha ninguém no mundo.
Era uma
moça jovem, o seu nome não me lembro, só o apelido a que nos referíamos a ela: Estrupicia.
Não tinha nem um metro e meio de altura, necessitava de uma bancada para arrumar
a louça e acessar os armários; fazia todo o serviço atrapalhado, daí o apelido,
e pouco falava.
Posteriormente
com a reportagem dos Gabirus achei que ela se enquadraria, mas ela foi dada muito
antes.
Morávamos
na Av. Brigadeiro Luiz Antônio defronte a Rua Batatais, no primeiro andar. Logo
descobrimos que a moça não andava de elevador. Até aí tudo bem, poderia usar a
escada. Mas também tinha medo de escuro. A iluminação dos pisos era simultânea,
de modo que um andar acendendo a luz da área de circulação acendia todas as
luzes de todos. O interruptor ficava junto à porta. Ali ela não chegava, era
escuro.
A pobre
moça ficava junto à janela que iluminava a escada esperando acender a área de
circulação, uma vez iluminada entrava correndo no apartamento antes que
apagasse novamente.
Não sei
o salário que minha progenitora pagava, creio que não era muito; a moça só saia
de casa para ir à feira próxima. Comprava vestidos. Toda semana ia até a
barraca de roupas, arrumava um vestido, isto após pedir um adiantamento, o que
deixava Dona Deia enfezada, voltava, fazia todo o ritual da luz, entrava e só
saia na semana seguinte. E, não aprendia o serviço do apartamento de cento e
vinte metros quadrados; portanto um tanto grande e com muita coisa a fazer. Todos
nós trabalhávamos fora e realmente necessitávamos do serviço.
Certo dia
a Estrupicia sumiu, foi doada. Sim, minha mãe doou. Dona Deia costumava ir às
sextas feiras tomar banho de defesa com Pai Ismael perto do zoológico; com
muita lábia, que lhe era própria, fez o Pai de Santo aceitar a moça para morar no
terreiro. Resolveu o problema já que a coitada por não ter família não tinha
para onde ir. Assim minha progenitora repassou a doação.
Não sei
quanto tempo ela ficou por lá, mas alguns meses depois Da. Deia falou que não a
viu quando tomava seu banho espiritual. Nunca mais ouvimos falar da pobre moça.
29/03/13
Tony-poeta
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