DANÇARINA
Domingo
no Guarujá, estamos em plena temporada. O dia está nublado, porém muito quente,
choveu durante noite e agora, perto das duas horas da tarde, o sol ameaça a
sair. O mormaço é presente e queima.
O Pátio
de estacionamento do Hipermercado está cheio, principalmente automóveis, já que
a população local que prefere bicicletas e motos está trabalhando. Todos
moradores arrumam o que fazer na temporada e executam com afinco sua atividade.
Durante o ano emprego é só ocasional e difícil. Há congestionamento na saída do
estacionamento, vez ou outra alguém buzina como que isto fosse fazer a fila
andar.
Três moças
dançam numa das coberturas de carros ao som vindo de uma Perua estacionada atrás
delas. Faz parte da animação que acontece em toda a cidade durante a temporada.
São ninfetas que acabaram de completar a maioridade; o que dá para perceber
facilmente pelo corpo, com a bunda arrebitada e os seios proeminentes; tronco e
pernas ainda em desenvolvimento. Todas têm aproximadamente um metro e sessenta,
cabelos longos soltos as costas e vestem um conjunto de short e blusa de um
amarelo vibrante.
Dentre elas
se destaca Inês. Enquanto Mirtes de pele clara, muito branca desaparece na
roupa e Marta de pele bronzeada forma um conjunto discreto com a vestimenta; Inês
de pele negra contrastando com o amarelo forte forma um conjunto de grata
harmonia complementado pelos olhos grandes e sorriso aberto e simpático.
Realmente um belo destaque.
A apresentação
consiste com a colocação de som no carro de apoio, o que é feito por Zezão, o
motorista da emissora, Paula é a supervisora, que até o verão anterior dançava
do mesmo modo que nossas moças e tem o poder de admitir e demitir, o que a
torna severa. A música, selecionada pelo estúdio leva em consideração não o
estilo, mas sim a batida. Quando mais cadenciada esta for, mais adequada para
animar o ambiente, apenas tem que ter algum grau de conhecimento pelo publico,
tão variado de veranistas.
O dia
começou às sete horas, foi dada a orientação, ensaiado alguns passo e a seguir
a dança continua e exaustiva, com a sola dos pés marcando os movimentos,
seguida de todos os movimentos de joelhos, coxas, bunda e tronco. Além do movimento da cabeça destacando os
cabelos longos e o sorriso sempre presente e o olhar para o possível público.
Uma difícil coreografia para amadores como são as moças.
Há duas
horas as três dançam; já se aproxima da hora da refeição. O esforço é enorme e
ninguém olha. Ninguém se dignou a parar, poucas pessoas batem o canto dos olhos
para nossas atrizes que são consideradas parte da paisagem de verão. Ninguém
bateu uma única foto. Todos estão apressados em desvencilhar logo das compras e
curtir o passeio.
Inês enquanto
caprichava nos passos pensava: - Pode aparecer alguém da televisão e ver meu
talento.
Na verdade
por gosto seguiria uma carreira voltada para artes, já participara de algumas
peças teatrais na escola e fora elogiada. Tinha uma voz suave e afinada, mas
sem cursos na área e sem condições de fazê-los longe do município a idéia foi
abandonada. Não que vivesse na pobreza, seu pai trabalhava registrado, todos da
família, ou seja, a mãe e os dois irmãos ajudavam em bicos na temporada e
épocas de maior movimento, o que conferia um padrão de vida bom, sem excessos,
mas sem condições de investimento. A casa era própria e bem montada, não
faltava nada em termos de conforto.
Iria fazer
pedagogia e ser professora:- não faltam empregos apesar do baixo salário. Estava
envolta nestes pensamentos quando parou um Camaro amarelo, quase da cor de seu
conjunto. Dentro um senhor de meia idade, sério, muito sério, fez sinal para
ela:
Imediatamente
lembrou-se das recomendações: sorriso nos lábios, falar pausado, arfar os
peitos, encolher a barriga, ser simpática e agradável. Escondendo a ansiedade
deu os longos quatro passos até o carro. Sorriu:
- Pois
não, senhor...
- Onde
fica a tenda que vende cerveja? Indagou seco o motorista.
- Ali. Ainda
sorrindo, escondendo a decepção apontou com o dedo.
- Ta! Foi
a resposta seca do homem e colocou o carro em movimento na direção indicada.
Inês voltou
a dançar, logo chegou o morno almoço na embalagem de alumínio que dizem
quentinha.
12/01/14
Tony-poeta
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