sábado, 20 de setembro de 2014

TALVEZ FALAR



TALVEZ FALAR.


Talvez
Fale sem pensar
Por confiar em minha fala.
Talvez
Diga por dizer
Tentando ultrapassá-la.
Talvez
Seja incompleta
Com hiatos ao falar.
Talvez
Viva por viver
Certo que irei morrer
Talvez
Falar, viver e morrer
Seja o conteúdo do dizer.
Mas...
Para que rodar?
O objetivo não conheço
Talvez ...
Andar
Possa ser o desejo
E assim tatear
Pedra por pedra
Do fim ao começo
Num grito falar:
Pertenço e não pertenço!
E, soltando versos ao luar
Pela paixão que desconheço
Entre sílabas busco achar
Tua imagem no sonhar
E um verso falar.

21/09/2014
Tony-poeta.



A SOGRA DO ALAOR

A SOGRA DO ALAOR


Alaor estava desolado. Julinha sua esposa tenha feito um vestido novo para Dinorá sua sogra, e ficava de minuto em minuto perguntando se ela estava bonita:- parecia que vestia uma boneca, pensava ele. Dinorá continuava estática frente à televisão, e não poderia ser diferente. Era uma Não Viva. Estas pessoas, as Não-Vivas, habitavam a maioria das casas da região. É uma longa história.
Alaor começou a recordar:
Há oito anos o laboratório Organic implantou uma semente de transgênico. Escolheu a dedo cinco municípios isolados nas margens do Jujui, pequeno riacho que cortava todos eles. O experimento começava no Jujui da Nascente, e ia até Jujui de baixo, passando pelas cidades de nome de Cima, da Margem de praia e Jujui do Barranco.  Ao todo moravam mil e quinhentos agricultores nesta área. Viviam de plantar milho e feijão e tinham alguma criação para consumo.
Os Técnicos disseram que tinham colocado um vírus que quando as sementes brotassem sairiam e matariam todas as pragas.
Foi uma fartura. No primeiro ano a produção deu o dobro, saiu até na televisão no Jornal do País.
A lavoura de milho, no mesmo ano, foi feita como de costume: enterrar os pés de feijão depois de retirada as sementes, o que era um bom adubo e barato. Daí o milho era plantado.
Mesmo com tempo bom e chuvas o milho minguou e não deu nem para o gado.
Ano seguinte, plantaram feijão e não nasceu nenhum pé. Aí começou a tragédia.
Primeiro vieram os cientistas da firma; depois de alguns dias os do governo e a seguir os cientistas do exterior: da Europa de dos Estados Unidos.
Vieram muitos cientistas, todos com roupas de astronautas, olhavam e depois iam embora.  
Depois de algum tempo, sumiram todos os cientistas e representantes da firma. Isolaram os cinco Jujui e os Municípios
Em volta da Mata Florida, do Pássaro Alto, da Cavalcantelândia e de Jurema Triste. Mais mil e quinhentas pessoas.
A partir daí ninguém mais entrava nem saia na região. Diziam que o vírus também atacava a pele das pessoas e por aí também era transmitido.
Era verdade. A pele de todos habitantes ficou parecendo escama de peixe; tinha que passar lixa para tirar a poeira que sobrava.
Pouco depois vieram tratores e represaram o Rio Jujui. Em tempo recorde. Não queriam que contaminasse o Rio Bonito, onde desaguava. Para isso fizeram uma barragem e desvio, onde a água ficou entre o planalto e a montanha que cercava a região, sem saída.
Diziam que resolveriam depois como escoar. Quem morava na parte baixa teve de mudar para a o alto, pois a água inundou. O riacho como era muito pequeno, levaria muito tempo para chegar à parte alta, talvez nem chegasse, pois em pleno semi-árido com secas às vezes de mais de ano, dificilmente encheria o açude.




                                                                        I


Seu Genivaldo, prefeito de Jujui de cima, o político mais experiente do local, aproveitou que os Movimentos Verdes estavam fazendo barulho no mundo todo e, resolveu agir. Ele tinha conhecimento, chegou a ser suplente de deputado pelo partido da situação. Quando o Deputado Tinoco ficou três meses fugido, até provar inocência numa acusação de fraude, foi ele que ficou no lugar. Foi, portanto deputado atuante.
O próprio Prefeito fez uma petição, não tinha nenhum doutor advogado nos isolados de Jujui. Expôs que estavam num campo de concentração e sem direito de ir e vir, o que é da constituição, e completou com muitas encheções de lingüiça que achou por bem colocar, para dar mais volume ao processo.

Chamou Roger e Alaor para corrigir o português e enviar o manifesto.
Enquanto olhava a enorme papelada, Alaor que orientava na escrita pensava na vida.  
Da. Zefa, sua esposa perguntou:- Não está bonita?
Sabia que qualquer resposta que desse se referindo a Não-Viva geraria discussão.
Sua sogra, filha de Coronel, sempre altiva e mandona continuou assim, mesmo falecendo. Parece que as pessoas que não voltam a terra não morrem e permanecem vivas palpitando na vida dos outros. Falou um – Ta! Bem seco.
Zefa continuou:- Vê como eu penso direito, como está toda dura fiz as laterais soltas e alinhavei depois, ficou perfeito. Ela está de roupa nova para ver televisão.
Conhecendo a mulher, deu corda. –Ainda bem que você mantém o carinho, pensando:- A velha não larga do pé.
-Pois vou manter ela bonita até resolver este problema. Retrucou a esposa enquanto alinhavava as dobras que ficaram caídas na região das axilas.
Alaor, bravo com a interrupção de suas recordações ficou imaginando da besteira que fez de vender sua casinha na Capital e ir para o sertão, só porque Zefa não queria deixar a mãe velha sozinha.
Agora a velha também mandava nele, mesmo naquele estado. Devia ter ficado com os amigos de escritório, com o João e o Junior bebericando no final do expediente e fazendo o que queria.  Mas estava lá, não adiantava.  Continuou a pensar no texto.
O Roger, dizem que quem deu o nomeou foi o avô que gostava de bang-bang. Como a mulher não deixou por nome estrangeiro nos filhos, colocou no neto. A avó morreu alguns meses antes, não atrapalhando o registro.
O Roger era esforçado, aprendeu a usar o computador e depois a consertar, era o único que entendia. Principalmente agora que não dava para sair nada do Rio Jujui, nem uma agulha; era só por internet, o contato de qualquer objeto por um habitante é contaminação certa.
Roger leu o grande requerimento e, depois de três dias de discussão entre ele, o Alaor e o Prefeito e destacaram: O campo de concentração e o direito de ir e vir.
Roger postou na net como petição.
Foram colhidas milhões de assinaturas. Do País não foram muitas, era quase tudo de fora. Mesmo assim, o governo achou por bem, para não ter pressão Internacional, mandar ao Supremo Tribunal de Justiça.
Nunca se viu uma petição andar tão rápido.
Quinze dias depois começou o julgamento. Ninguém pediu vistas, realmente era um assunto de urgência. Três dias depois estava quatro a quatro e o relator Ministro Marcondes ficou com o voto de Minerva.
Fez uma longa explanação do motivo de seu voto, como todos os Ministros fizeram. Após três horas, sem apartes, concluiu: Não era campo de concentração, pois não tinha câmara de gás; portanto um simples confinamento. Este confinamento era amplo e dava a seus habitantes o direito de se locomoverem nele mesmo não havendo veículos nem animais de tração. Além do mais era apenas uma medida sanitária, provisória, e que seria revogada assim que o problema do vírus fosse resolvido. Acrescentou: esta medida se justificava pelo bem comum. Não mudaria nada, portanto.
Continuaram confinados. Parte da população adoeceu por falta de bactérias para digerir os alimentos e outra não. Algumas pessoas mantiveram as que participavam da digestão e não foram afetadas. Idosos e crianças foram as maiores vitimas e a população diminuiu pela metade.
Já as bactérias de decomposição da natureza, estas desapareceram, mais nada apodreceria e se decomporia no local.
O governo então resolveu, via Net fazer o controle familiar. Como já mandasse a ração alimentar, pois ali não mais se produzia nada e, por falta de milho e capim a criação já tinha sido comida ou sacrificada. Passou a distribuir pílulas a todas as mulheres, com a ameaça de cortar a alimentação caso alguma ficasse grávida. Alaor acreditava que não seria difícil isto acontecer.
Zefa chamou para o jantar. Como sempre se sentaram ao redor da televisão, desde a morte da sogra abandonaram a mesa. Mesmo Não Viva a presença era obrigatória. A comida era a ração monótona de sempre, a única que conseguiria ser absorvida pelo intestino, ou seja, cinco pílulas de vitaminas e sais minerais, um fiambre de carne para dar proteína e uma papa instantânea de batatas para fazer o bolo fecal. As pessoas estavam todas magras, não havia problema de obesidade. Era uma população viva, magra e descascando.


              


                                                II   

 À noite Roger passou para ver o computador e, falou impressionado com a divisão da população. Pouco mais de mil habitantes restantes estavam divididos em dois grupos, fora os seus amigos: os beatos e os liberados. Sobrava o pequeno grupo isolado dele, do Alaor, do prefeito Genivaldo e de mais trinta pessoas que ficavam lendo, filosofando e procurando uma solução para o problema. Era o grupinho dos intelectuais, que os outros dois grupos olhavam estranho.
Roger começou a lembrar da divisão da população. Depois de muitas mortes e dos velórios uma parte se retirou para as Igrejas e ficou em oração e penitencia. Os intelectuais começaram a ler. Fizeram uma biblioteca com os poucos livros que existiam; quase ninguém tinha livros, a não ser o prefeito que fez uma prateleira de cinco divisões de cinco metros cada e foi à capital. Comprou vinte e cinco metros de livros encadernados de cores chamativas para ornar seu gabinete. Este era o principal acervo, no meio dos livros por metro havia alguns bons romances e uma coleção de filosofia, boa de se ler.
Já com os liberados aconteceu o seguinte. Como não gostassem de Igrejas e não liam ou por não saber, ou por falta de vontade; passaram a andar a esmo no que restou das cidades, sem rumo e sem objetivo. Como todas as mulheres não iriam engravidar, pela distribuição de pílulas e, sem o que fazer, começou a pulação de cerca. De início houve brigas e mortes. Afinal o povo dali é muito machista. Mas como o problema continuasse; os prefeitos, os padres e Roger, Alaor e mais três letrados fizeram uma assembléia com os adúlteros.
Começou brava, foram remarcadas três vezes, até que se chegou a uma conclusão: Não tinha jeito. Ninguém ia parar de pular a cerca. Era melhor então cada um assumir sem brigas e sem ciúmes. Foi falado muito claro: Se teu vizinho comer tua mulher, você tem o direito de comer a mulher dele e ninguém vai brigar e se matar por isso.
No começo ainda deu um ou outro tapa, mas depois cada um assumiu sua postura e não teve mais nenhuma briga. Agora se anda em grupos de homens e mulheres, ninguém tem compromisso com ninguém e fazem o que quiserem na hora que acharem apropriadas.  Lógico que os religiosos não concordaram e se retiraram. Para eles adultério é adultério, mesmo numa população que não vai ter mais filhos. Mas resolveu- se o problema.
Naquela noite conversaram ainda sobre o que deve dizer o Presidente da República. Existe uma grande ansiedade geral. Foi anunciado no Jornal do País na TV que faria um pronunciamento antes da novela, dali a três dias, no sábado.


                                                       


    III

Dia seguinte Alaor, Roger e Seu Genivaldo encontraram-se no velho celeiro como de costume. Só existiam cinco computadores funcionando em toda região. Tinham recolhidos todos os aparelhos com defeito para verem, durante o dia, enquanto tinha eletricidade, ver se aproveitavam as peças boas e tentar montar mais máquinas, senão ficariam fora do mundo.
A luz estava racionada, por não conseguirem pagar a conta, não havia rendimentos na população. Tinha sido cortada. Mas o governo, por meio de um Decreto Lei mandou que fosse restabelecida.
Fizeram reunião com as distribuidoras, os moradores não puderam ir, por causa do confinamento e ficou estabelecida luz das dez da manhã até o final da novela. Tinham que aproveitar o tempo. A MUNDINET doou computadores para a comunidade e estavam no porto aguardando, mas para efetivar a doação os deputados pediram comprovação do numero de família, de acordo com o formulário do Regimento Nacional de Estatística.  As prefeituras estavam sem funcionários, já que não havia mais serviço e salário. Os três tentaram fazer tal relatório. Já enviaram cinco, mas sempre os números apresentados não batem com o dos burocratas da capital e é pedido outro mais minucioso.  Há cinco dias enviaram um bem detalhado, a resposta deve vir de dois a três meses; até lá se aguarde. Se é que vão conseguir entregar com todos os custos que acarreta.
As peças: não adianta nem pedir, além de não ter como pagar, a entrega é difícil, foi depois de murada a região, feita uma cabine a prova de vírus. A carga chega nele na capacidade máxima, se ultrapassar não é entregue. Como num cubículo de um e meio por um mal cabe a ração do mês, mesmo o material sendo doado necessita de outra carga. O governo só disponibilizou uma equipe mensal, dado o alto custo da segurança. Portanto, fora a ração nem pensar. O remédio é remendar o que se tem e rezar para não se desconectar do mundo e torcer que a Mundinet faça a entrega prometida.


                                                                     


             IV





Dia seguinte Seu Genivaldo e Alaor conversavam sobra os não vivos. Lembravam que os primeiros mortos depois da ORGANIC ainda se decompuseram. Os que e seguiram foram enterrados em covas de sete palmos com a cruz, como era a tradição.
Era seca. Com a chegada da chuva, a terra sem húmus tinha virado areia e a enxurrada fez todos os corpos boiarem. Foi um horror. Corpos não vivos boiando por todo lado. Reuniram o que havia de tocos de arvores, galhos e madeira e, com o Padre, o Pastor e até com a benzedeira, fizeram uma reza e cremaram todos. Como morreu muita gente desde que começou o vírus, tiveram que queimar muitos e foi o fim da gasolina no Vale de Jujui.
Depois disso, os que morriam não se tinha o que se fazer. Não adiantava enterrar, já que iam aparecer com a chuva do jeito que foram sepultados. Não havia cimento para se fazer uma sepultura resistente. Tijolo, até que podia se pegar nas casas sem moradores dos que tinham falecido, mas não dava para fazer a massa.
Foi aí, que em outra reunião agitada, ninguém teve nenhuma sugestão, e sem conclusão deixaram que cada um cuidasse do seu Não Vivo, pois chamar de morto alguém inteiro não dava.
Assim cada um iria se virar de acordo com o grau de afeto por seu morto.
Conforme foram morrendo mais pessoas, foi se fazendo quartinhos nos fundos com as embalagens de ração; pequenos barracos e colocados os Não Vivos até que o governo e a Organic achem uma solução.
Seu Genevaldo lembrou que Dona Dinorá era a única que ficava na sala em frente à televisão, coisa que ela sempre gostou, capricho da Zefa, Eta filha dedicada!
Alaor acenou com a cabeça com vontade de dar um xingamento, mas calou-se.
Estavam ansiosos pelas palavras do presidente. Combinaram de chamar o Roger e assistirem juntos. As notícias indicavam que alguns progressos tinham sido conseguidos.
Seu Genivaldo falou da saudade do seu milho e feijão que crescia bonito naquele paraíso do sertão que tinha rio e fartura. Lembrou do cachorro, do burrico, das galinhas, o homem quase chorava. Alaor também estava sensível e esperançoso.


                                                 


              V

Era o pronunciamento. Estavam na casa de Alaor; Dona Zefa não queria deixar Dinorá sozinha, afinal era uma filha companheira, dizia ela. Frente à televisão sentavam Seu Genivaldo e esposa, Roger e esposa e Alaor.
Acabou o jornal. Deu a vinheta e entrou o presidente. Começou falando
- Trago boas notícias.
Todos se animaram. Era à hora. O Presidente continuou
-Conseguimos, graças ao problema do Jujui fazer a primeira Reserva de Caatinga do País. Mostrou o mapa. A região que moravam era apenas um pontinho, cercada de imensa faixa marrom que representava a reserva.
Ficaram meio desconfiados. Ninguém falou nada. A seguir o Presidente disse.
-A virose já tem meios de ser contida; todos sorriram, e continuou: Os técnicos da Organic desenvolveram uma planta que contém esta invasão e, portanto, a virose ficará restrita onde está sem perigo de contaminar o resto da reserva. È a espinheira santa milagrosa, conforme os cientistas a nomearam. Alaor falou:
-Vão cercar a gente com espinhos além do muro. Todos fizeram silencio.
O Presidente continuou: a via de acesso a Jujui vai continuar sendo mantida e conservada. Porem não será reaberta.
Por fim arrematou: Quanto à contaminação de seus habitantes: no momento, estão se realizando estudos que apresentam esperanças e o Ministério deverá entregar um relatório dentro de seis meses, portanto no próximo presidente.
Por enquanto conseguimos trezentas calorias dia de melhora da ração de cada habitante e mais uma polivitaminas.
Boa Noite, a seguir veio à vinheta anunciando a novela Direito a Felicidade.

20/03/12

Tony-poeta







sexta-feira, 19 de setembro de 2014

JÁ FOMOS



JÁ FOMOS.

Ninguém está pronto para viver,
A vida: Um eterno tatear
Contornos de objetos...
Palpar e imaginar.

Cada imagem de zelo
De alegria e pesadelo
Muda.
Os contornos mal fadados
Estão sempre deslocados
Jamais permitem aferir
Um momento seguro,
Uma imagem completa,
Uma linha, uma reta
Onde possamos seguir.

Tateamos desesperados,
Temos ares sapientes
De quem já tudo sabia
E num engano inocente
Seguimos a trilha errada
Composta de ironias.
Mas...
Seguimos sempre altaneiros
Choros: Apenas tropeços!
Não conseguimos parar...
Quando nos cremos triunfantes
Vemo-nos como pobre infante
A nossa infância voltar.
Porém...
Palpando sempre, novo começo
Vamos de tropeço em tropeço
Rindo pouco, evitando chorar
Sentimos que o tempo se esvai
Com ele o espaço cai...
-Tempo e espaço irmãos que nunca se separam-
Unidos como sempre foram
Descobrimos que nosso espaço
Termina em nosso tempo...
Temos que admitir:
Já fomos...

19/09/14

Tony-poeta

LEONOR, A PATINADORA GORDA - CONTO -

LEONOR, A PATINADORA GORDA.


Romualdo foi conversar com o Gerente do Hipermercado do Sul, Leonor moradora do núcleo, onde ele vereador tinha grande votação a ponto de manter sua reeleição, queria a vaga de patinadora.
As patinadoras eram a novidade daquele grande Mercado vindo do Sul, onde mocinhas sobre patins orientavam os compradores, agilizavam os caixas, sempre deslizando elegantemente com seu corpo de manequim e a camiseta escrita: Estou para ajudar.
O grande problema é que Leonor, uma pessoa adorável, comunicativa e alegre, cujo sonho de infância foi ser patinadora artística, era gorda e alta. Nada parecido com alguém que praticasse tal esporte; mesmo assim patinava com a mesma desenvoltura que as magricelas que lá trabalhavam.
O político foi conversar com Julio, o gerente. Era uma pessoa jovem de boa conversa que tomava umas cervejas com as funcionárias após o expediente, como era costume local e ainda era de confiança do proprietário, Sr. Hans.
 Explicou a demanda de sua afilhada:
-Mas é gorda, falou Julio, todas são magras.
-Mas, anda de patins melhor que elas e é muito agradável e inteligente.
- Sei não! Respondeu Júlio, não animado, se o Sr. Hans mandar eu coloco.
Para instalar o Hipermercado na cidade, Hans representando um grupo de empresários interessados na região, e sabendo da concorrência de Grandes Grupos da área, fez acordos que não são imagináveis com o prefeito, o Gervásio. O vereador saiu desconsolado.
Dia seguinte, em uma coincidência que Romualdo não acreditou como tal, já que conhecia o prefeito, foi chamado para uma conversa no Gabinete.
Entrou na sala do prefeito, sentia-se estranho, raramente ia aquele covil de negócios escusos, mas além dos votos que tinha que manter admirava muito Leonor e faria o possível para ajudá-la.
- Que bom que você veio, falou o Edil. Vou fazer uma proposta que interessa a nós dois. Pode estar certo que é um bom negócio para a cidade, como por cinco mandatos você faz questão de exigir.
- O que me propõe? Falou o vereador.
- Quero asfaltar a Avenida que vai para o Brejão, é este o nome do Bairro de Leonor, vou colocar linha de ônibus para ajudar o pessoal e ela vai até a pracinha, onde moram seus eleitores.
- Sim, acenou Romualdo.
- Para isto preciso da aprovação da Câmara, tem umas desapropriações que são obrigatórias, senão não sai nada. Veja o projeto, e o Prefeito abriu um mapa, com os documentos para liberar a verba do Estado. Tudo normal. Romualdo olhou e examinou papel por papel.
- Realmente é de grande valia, por fim falou.
- Você vota? Indagou o prefeito.
- Conforme esta demonstração, sim.
- Ótimo. Falou a Prefeito com cara de triunfo.
- Sabe Gervásio, ali mora Leonor, é gordinha e quero arrumar um emprego de patinadora no Hipermercado, é uma moça excelente.
- Patinadora? E o prefeito começou a rir...
- Sim, ela patina desde criancinha, é uma das melhores.
- Par demonstrar boa vontade, já que você demonstrou comigo, vou telefonar pro Hans. - Nicinha liga pro Hans, falou para secretária.
Logo a seguir...
- Hans, tenho um pedido estranho. Quero que você contrate uma patinadora gorda.
- Ótimo, à noite tomamos um wisque. Mandarei, sim! Pronto, dirigindo-se ao Romualdo, mande a moça falar com o Julio amanhã cedo. Está contratada.
- Mandarei, sim! Obrigado.
- O que, que é isto, uma mão lava a outra.
O vereador saiu desconfiado, mas... Tudo bem.

A CONTRATAÇÃO

Leonor após ser avisada que o emprego era seu. Dirigiu-se ao Supermercado. Foi direto falar com o Júlio. Este já a esperava. Olhou-a de cima a baixo, coçou o queixo. Falou:
- Conforme o prometido, o emprego é seu. Vai até Dona Alzira fazer o uniforme. Qual o número de patins que você calça?
- Quarenta e cinco, respondeu a moça. Sabe sou muito grande e os pés acompanham.
- Onde você comprou patins deste número?
- Mandei fazer de encomenda em São Paulo, não existe pronto.
- Demorou quanto tempo?
- Três meses, mas valeu a pena, nem os sinto em meus pés.
- Dá então o endereço para que eu mande fazer...
- Demora muito, posso usar os meus?
- Tenho que falar com Neuza do Recursos Humanos, me aguarde.
Meia hora depois.
- A Dona Neusa falou que é norma da Instituição não aceitar empréstimos. Temos que mandar fazer.
- A cidade está esburacada, retrucou Leonor, não estou conseguindo patinar. E se fizer a doação dos patins em troca do emprego?
- Não sei! Pegou no telefone:
- Neusa, sou eu de novo, se a moça doar os patins.
- Certo! Vamos ver se assim ajeita.
- Leonor, se doar os patins, você começa a trabalhar assim que o uniforme ficar pronto, mas os patins ficam da empresa.
- Não faz mal, eu quero trabalhar com eles, não importa o dono.
- Então está acertado, falou Júlio.
- Sim, retrucou sorridente e feliz a moça.

O TRABALHO

De início aquela moça gorda e grande chamou muita atenção de clientes e funcionários. Virou motivo de comentários
Leonor porém era muito doce, gentil, atenciosa. Agradava todo mundo.
Com o tempo todos cliente se dirigiam a exótica funcionária. Além de se destacar pelo tamanho, não deixava de atender desde a mais simples demanda até o mais complicado problema. Era um destaque,
Como tudo que se destaca provoca inveja, esta começou aos poucos.
De início as outras patinadoras que ironizavam apenas o tamanho da nossa patinadora, começaram a procurar novos defeitos e criar inverdades para ver se provocavam constrangimentos a mesma, tudo em vão.
A central de boatos e maldades foi ampliada até o gerente que começou a ficar incomodado com a boa penetração da moça na clientela;
- Logo me mandam embora e o emprego fica com ela, falava,
Leonor não se abalava, fazia seu serviço sem se importar com as fofocas. Estava sempre feliz.

A CAMARA.

Romualdo chegou excitado no dia da votação da avenida. O prefeito o tinha enganado. O partido conseguira o mapa real que fora enviado ao Governo do Estado e, ao invés de beneficiar a comunidade, esta seria desapropriada, jogada na sarjeta, como costuma acontecer nos acertos da política.
Mostrou de um por um de seus colegas o absurdo e, justificava assim sua mudança de posição.
A sessão foi tumultuada, insultos, que normalmente ocorrem nessas ocasiões se excederam. A sessão foi suspensa por três vezes para acalmar os ânimos.
Finalmente e avenida foi rejeitada por um voto. O prefeito perdeu graças ao vereador da oposição.
Ninguém lembrou de Leonor.

O DESFECHO

Gervásio ficou furioso com a derrota, falou todos os tipos de palavrões que conhecia e até inventou alguns novos. Este filho de uma puta de vereadorzinho me paga.
Alguém lembrou de Leonor, que endossava o voto.
- É Rua! falou o prefeito.
- Coitada! Falou Mirtes, a secretária, não tem nada ligado a política, trabalha com gosto e até Dona Maria, sua esposa gosta dela.
- É verdade. Falou o prefeito, pobre moça na mão deste canalha, traidor. Mas Política é política e trato é trato. Liga para o Hans.
- Sei que é boa funcionária, seu Hans, falou o prefeito, mas Romualdo não cumpriu o trato, tem que pagar.
- Certo seu Hans, também sinto muito, assim é a vida.
No outro dia Júlio, junto com as outras patinadoras e funcionários invejosos comemoravam.
Leonor foi embora sem seus patins, os olhos lacrimejavam.

19/09/14
Tony-poeta







quinta-feira, 18 de setembro de 2014

PELADO



PELADO


- Vai amputar a perna na coxa, pobre Roberto. Era a mensagem de Junior no celular.
Junior, Roberto e João eram advogados do mesmo escritório, mesma faculdade e mesmo bairro. João, quem recebeu a mensagem ficou aflito. Seu velho amigo ficaria aleijado, e poderia até morrer. Que agressividade deste tal melanoma.
Tomou um uísque, andou em círculos pela sala, estava sozinho. A esposa estava no Exterior visitando o filho caçula que fazia intercambio. Os outros dois casados estavam espalhados. Começou apresentar um misto de preocupação e medo, para não dizer: Pavor!
Foi ao escritório, pesquisou no computador, ficou mais apavorado. O tal câncer podia aparecer em qualquer parte do corpo.
- Muito grave! Exclamou. Bem passei há um mês no cardiologista. Porra! Ele não examina a pele. Olhou meu peito, o peito dos pés e mais nada. Ah! Também olhou o braço para tirar a pressão. Falta todo resto.
Olhou para o espelho da sala, era amplo, dava para se ver inteiro. Tirou toda a roupa, olhou de frente, de lado.
-Esta luz é fraca e não vejo as costas, pensou. Olhou novamente buscando o que não conseguia saber, teve uma ideia:
- O quarto de vestir de Odete, como não pensei? Tem vários espelhos, ela se vê de corpo todo antes de sair. Subiu a escada.
Acendeu a luz. Estava nu frente a cinco espelhos que mostravam todo o corpo. Procurou uma pinta preta. Com 60 anos de idade achou várias pintas marrons. Suou frio. Olhou bem. Voltou ao computador. Meia hora depois concluiu que eram manchas da idade.
- Que alivio. Mesmo assim procuro um dermatologista amanhã. Um olhar técnico não custa.
Olhou novamente ao espelho, já convencido que não era nada. Notou que estava pelado.
- Poxa, estou pelado! Exclamou. Não lembro de me ver assim. Sempre vestido e de preferência de terno e gravata. Que estranho.
- Na praia, só de moleque e de short, depois conheci Odete. Tinha quinze anos. Sempre comportado:- Ah, se não me comportasse! Recordava.
Continuou a recordar: Na lua de mel, ela exigiu que apagasse a luz... Apago até hoje! É bem menos, é claro!
- Já sei no banho! Sempre demorei e o espelho fica embaçado, nunca vejo nada.
Olhou curioso o corpo todo, de frente, lado costas:- A barriga está grande, vou fazer o regime, bem que o médico mandou. Olhou os genitais;
- Pequeno, mas não estou excitado nem pensando em nada. Será que diminuiu com a idade? Acho que não! Tanto faz....
Voltou a sala, a roupa estava na cadeira. Olhou para ela, ficou em dúvida:- Eu sou a roupa ou sou eu. Não se vestiu.
Foi sentar na cadeira, uma cadeira estofada de veludo:- Será que suja se eu sentar, pensou, suja sempre a cueca? Na foto de nudismo usam uma toalhinha.
Encheu o copo de uísque novamente, foi até o lavabo pegou a toalha engomada e bordada. Se sujar põe na máquina e passa de novo. Voltou para a cadeira, a levou frente ao espelho.
Colocou a toalha, sentou, olhou bem ao espelho, levantou o copo de uísque e brindou:
- Prazer em re-conhece-lo.

Tony-poeta
18/09/14



Trânsito



Trânsito...


Normalmente não fico nervoso no trânsito, sou bastante calmo apesar do trafego complicado entre Guarujá e Bertioga.
Quando volto na sexta feira, mesmo por uma estrada secundaria, lotada de turistas com seus carros grandes, muito grandes até para o tamanho dos ou das motoristas. Parecem que compram o bem como status, e quanto maior mais importante se sentem.
Assim conseguem desrespeitar qualquer lei de direção. Certamente acham que: partindo para seu descanso e poderosos pela grandeza tudo podem.
Consigo me controlar e tudo bem.
Hoje, quinta-feira, voltando de trabalho, o volume estava acima do normal:- Resolveram descansar antes, pensei.
Levei a primeira fechada enquanto pensava. Era uma fêmea loira, não deu para ver a idade pois o carro era muito maior que o adequado para a mesma. Dei um sorriso e imaginei que a mesma comprara um carro errado, as vezes erram no tamanho dos sapatos que tanto gostam.
Mais alguns metros, um possante bólido em alta velocidade com um careca ao volante me ultrapassou em faixa dupla, tive que brecar senão a coalizão era certa. Pensei: Faltam óculos. Continuei meu trajeto. Estava cansado após atender mais de sessenta pessoas, mas ainda mantendo o bom humor, sorria: também iria descansar.
No caminho curto, vinte quilômetros, tive que brecar por mais três vezes devido a barbeiros e barbeiras a minha frente. Pensei: ah barbeiros! Logo eu que deixei crescer a barba para não ter trabalho. Estava começando a ficar irritado.
Foi aí que um carro com um cartaz: VENDE-SE, em sua lateral, atravessou a pista como não existisse mais ninguém além dele. Pisei no pedal, o carro praticamente parou, foi quando instintivamente coloquei a cabeça para fora e gritei:
- Não compre outro!
O piloto fez cara feia e eu dei um sorriso aliviado, estava quase chegando em casa.

18/09/14
Tony-poeta.





segunda-feira, 15 de setembro de 2014

AMO GENTE



AMO GENTE


Amo gente... amo muito
Só me incomoda
A cabeça desta gente
Que atrapalha o mundo.

Tony-poeta

15/09/14