sábado, 10 de janeiro de 2015

UM GABIRU NO PARAÍSO - Conto -


UM GABIRU NO PARAÍSO.
imagem Google

O Paraíso é um arquipélago perdido no Oceano, lá reina a paz e, lindas virgens esperam os homens que foram perfeitos nesta vida. Como estão vestidas com roupas típicas do Havaí, creio que fique por aqueles lados. A paisagem, logicamente paradisíaca, tem um pomar repleto de frutas de todas as partes do mundo, menos maçãs, vetada por motivos óbvios. As musas com seu discreto rebolado, aguardam com cestas de tâmaras os eleitos, que por lá passarão a eternidade.
Estas lindas moças, todas moradoras desde a Idade Média, quando foram recolhidas a mosteiros e retiros, esperam os eleitos. Esta pequena ilhota foi criada como extensão, uma vez que as outras ilhas já estavam lotadas. Isto aconteceu na Idade antiga e média. Nos tempos atuais há dias paradisíacos não chega ninguém. O dia nestas paragens dura cento e onze anos e quatro horas.
Das vinte eleitas, por sorteio, houve uma divisão em dois grupos de dez eleitas, que pacientemente aguardam há anos locais. O grupo mais antigo, será o primeiro a receber o hospede que está por chegar, já tendo sido anunciada sua breve presença.
Na manhã festiva, com o mar verde e o céu azul, a brisa tremulando levemente para refrescar, as dez sortudas já estavam de prontidão, com a cesta de tâmaras recém colhidas, a saia bem passada, e também o bustiê. Andavam sedutoramente de cá para lá, como preparando o corpo para agradar o eleito que se apresentaria.
Logo chegou Sigismundo, o Gabiru. Este apelido é dado as pessoas que nasceram e viveram nos lixões, ou seja, nos depósitos de lixo das regiões pobres do Nordeste do Brasil, hoje praticamente extinto. O fato de nascerem em total desnutrição, com seus pais desnutridos fez com que não crescessem normalmente; o nosso personagem tem um metro e quarenta e oito centímetros, a pele desnutrida fica pardacenta devida as precárias condições de vida, bem como os cabelos se tornam ralos. O nosso personagem, apresentava os cabelos amarelados e espetados e a pele de uma cor pardacenta e encarquilhada.
Porém Sigismundo foi um grande homem, honesto obsessivamente jamais lesou quem quer que seja. Casou e teve três filhos sendo abandonado pela esposa que alegava que ele não tinha iniciativa, não aspirava o melhor e nunca usara de artimanhas ilícitas para conseguir mais, coisa comum em todo ser humano, além do mais nunca roubara como os vizinhos. Por isso se mandou, deixando-o na mão com as crianças.
Com três filhos, trabalhou com afinco. Nascia o sol e já estava garimpando o que poderia ser útil no lixão. Era o último a sair, mal se alimentava. Assim conseguiu um carrinho de mão com uma carroceria de caixas de madeira abandonadas e duas rodas de bicicleta, o que permitiu que negociasse no vilarejo o que conseguia salvar. Além de comerciar com o carrinho, cansou de levar gestantes e crianças doentes ao Centro de Saúde recém fundado, para que se tratassem, salvando muitas vidas. Deste modo fez com que os três filhos estudassem, tivessem uma profissão e casassem.
Morreu dias após o casamento de seu terceiro filho, devido à desnutrição desde o nascimento e o ritmo de fome e penúria que passara pela vida. Realmente era merecedor de habitar a ilha.
A recepção foi formal, diria até um pouco fria. Mesmo após tanto tempo, as moças não demonstraram nenhum entusiasmo com o recém chegado. Ofereceram as tâmaras para que ele mesmo comece e até o rebolado transformou-se num anda normal e firme.
Algumas horas depois chegou o segundo homem bom, chamava-se Sigmund. Brasileiro, descendente de eslavos morreu tentando salvar um bebedor de vodca de um metro e noventa e cento e vinte quilos que se afogava, após conseguir, completamente bêbado, virar um luxuoso iate branco. O novo morador já tinha salvo a loira do convés [estes barcos sempre levam uma loira] e os dois tripulantes, porém o mastodonte se agarrou ao mesmo, em desespero por não saber nadar, e foram os dois ao fundo do mar.
O novo habitante tinha olhos e cabelos claros, um metro e oitenta e corpo atlético. Era velejador. Na juventude se impressionara tanto com um campo de refugiados em zonas de conflito na África e Oriente durante uma viagem a passeio, que toda fortuna de família e todos ganhos em torneios de vela aplicou em orfanatos, onde dedicou toda sua curta vida, não casando e não tendo filhos. Portanto também merecedor do Paraiso.
A recepção do novo morador foi um tanto diferente que a do Gabiru. As eleitas começaram a fazer o jogo feminino do olhar, olhando rapidamente ao novo morador, com o pescoço meio arqueado e a seguir desviando o olhar e andando mostrando com um discreto rebolado todas suas curvas e a seguir se aproximaram, cada uma com seu cesto de tâmaras e as saias balançantes para recepcionar o novo hospede.
Como no Paraíso se tem visão do mundo atual e diante da diferença dos eleitos, começou imediatamente as fofocas e os disque-disques entre as vinte moças. Afora a disputa entre os dois grupos, dentro do mesmo grupo começaram, por motivos diferentes, as intrigas e reclamações.
Não deu uma hora de tempo paradisíaco e foi pedida uma reunião com o administrador do Paraíso; sim também existe burocracia no local. Foi feita uma pauta de reivindicações. Não acharam oportuno fazer cartazes, que ficariam para outra ocasião se necessário. Foi exigido o seguinte:
- Como os dois moradores são brasileiros, que se siga o modelo do Brasil. Ao invés de tâmaras, caipirinha, mesmo.
A música deve ser samba, bossa nova e MPB, não aquela música chata e sacra. Nas festinhas pode ser funk.
Tem que ter azeitonas, este tal torresmo e outros salgados junto com a caipirinha, que nem nos trópicos.
As roupas estão completamente inadequadas, ao invés destas tiras de peno coloridos e de mal gosto, junto com este bustiê amarrotado; queremos que se dê preferência ao biquíni ou fio dental para praia, com roupa solta para a tarde e uma roupa mais provocante para noite.
Queremos colares, brincos e barangandãs como as mulheres de lá, não, esta coroa de flores no pescoço.
As sandálias são muito feias, queremos escolher nossos sapatos, sapatilhas e sandálias.
Queremos um Shopping.
Exigimos um cartão de crédito.
A diretoria do Paraíso se encontra reunida há horas, sem uma decisão.

10/01/15
Tony-poeta


sexta-feira, 9 de janeiro de 2015

TAÇA DE VINHO - versos livres -



TAÇA DE VINHO

Transformarei meu coração

Numa taça de vinho
Dar-te-ei meu sangue
Para teu prazer:
Voaras entre os cantos,
Os mais divinos
Que um som pode oferecer.
Dançarás ébria
A música dos deuses,
Tocadas por Baco em seu brindar
E nos volteios de luzes e raios
Te ensinarei como é amar.

09/01/15

Tony-poeta