O HIPERTENSO
José Tenório, o Tenório, estava aposentado há oito meses.
Perdera a mulher dois meses antes e morava solitário. Sua casa estava vazia. Os
três filhos mudaram por empregos melhores para a Capital e raramente o
visitavam. Tinha quatro netos e Isabel esposa de Rafael esperava o segundo
filho. Sua rotina era fazer alguma coisa para comer, bater um papo no armazém do
Geraldo, às vezes jogar um dominó e ver televisão. Não tinha vícios.
Três meses antes de aposentar, quando da morte de esposa
descobriu que tinha pressão alta. Chegou a 21 por 11. Colocaram até comprimido
em baixo da língua no Pronto Socorro.
Fizeram eletrocardiograma, todos os exames e receitaram o remédio. Tinha
que tomar de manhã e a noite um comprimido. Era isto que o estava deixando
chateado. – Nunca tomei remédio nem para dor de dentes, agora vou tomar dois
comprimidos por dia. Não se faz isto com Caboclo do Velho Chico.
Tentou não tomar o remédio. Parou novamente no Pronto
socorro. Tentou tomar só pela manhã, ficou com dor de cabeça e dor na nuca.
Teve que tomar como o médico mandou. Sempre revoltado tomava os comprimidos a
contragosto.
O pior de tudo era cada três meses fazer nova consulta. Tirava
a pressão, o médico perguntava sempre a mesma coisa e dava receita para três meses.
Após este tempo tinha que voltar. Além dos comprimidos tinha este encheção de
saco. Naquele mês não tinha marcado consulta e ficaria sem a medicação.
Pensava:- Se não tomar alguns dias não vai fazer mal.
Foi neste dia que Rafael veio visitar de surpresa. Tivera
uma folga e foi ver a doença do pai. Ficou bravo:
- Pai o senhor não é analfabeto. Trabalhou a vida toda em
portaria falando com gente estudada, não pode fazer assim com a medicação. O vô
morreu de enfarto pela pressão. Levou o pai a uma farmácia.
Comprou os três meses de remédio, mesmo sabendo que era de
graça no centro de saúde. Viu em oferta aparelho de pressão digital:
- É fácil de medir a pressão? Perguntou ao atendente.
- Qualquer criança mede.
- Como é que faz?
- É fácil, eu ensino. É só colocar direito no pulso, apertar
o botão e pronto: Tem a pressão e o pulso.
- Para que o pulso?
-Para ver se o coração está disparado.
Rafael comprou também o aparelho para o pai. Prometeu voltar
assim que fosse possível.
Tenório começou a se entender com o aparelho. Pensou: se eu
controlar bem, não tomo dois comprimidos por dia e levo mais tempo para voltar
na consulta. Assim não tenho que ficar tomando estas porcarias.
A pressão subia, ele tomava o comprimido, mas não conseguia
fica sem tomar a dose diária. Foi quando conversando com os vizinhos, Mané e
Gertrudes, esta falou que banho quente, um pouquinho acima do morno abaixava a
pressão e ajudava. Logo imaginou uma solução:
Tomaria o remédio às 10 ao invés das sete; depois do almoço
começava a medir a pressão. Se estivesse alta, tomava um banho quente, a seguir
media a pressão e só tomaria o comprimido se não tivesse jeito.
Deu mais ou menos certo. A pressão não ficava muito alta.
Coisa de 17 por nove. Achou que estava bom. Depois do almoço começava a cada
duas horas fazer o controle, alegava que não tinha nada para fazer, tomava o
banho, media a pressão para ver quanto abaixou e, em duas horas repetia. Estava
tomando menos remédio e não tinha que ir de três em três meses no médico.
Chegava a tomar seis banhos diários.
Dia 17 chegou à conta de luz. Preparava-se para o banho. Foi
até o quarto, tirou a roupa, pegou os óculos, e foi olhar a conta antes de
entrar no banho. Era aniversário de morte do seu pai naquele dia. Morrera de enfarto
na mesma idade que ele. Olhou a conta: Metade do seu salário.
-quatrocentos reais, falou ele, é um roubo. Mesmo tomando
todos estes banhos. Nunca chegou a oitenta. Vai faltar dinheiro. O que vou
fazer?
Começou a rodear a mesa pelado pensando uma solução, o
dinheiro não ia dar. Como podia ser tão caro tomar banho?
Lembrou que o pai antes de ter o enfarto ficara muito
nervoso. Tinha que se aclamar. Colocou os óculos. Olhou novamente a conta e,
viu que o valor real era R$ 490,00. Para R$ 820,00 que ganhava não ia dar para
comer.
Deu mais três voltas na mesa, completamente nu, nervos e enfartou
morrendo na hora, que nem seu pai.
21/10/12
Tony-poeta