A PRIMEIRA
VISITA A BOITE.
Não tinha
ainda dezoito anos de idade; era, portanto, inicio de sessenta do século
passado. O contato social de um adolescente na época se resumia em visitas
familiares, estudos. Já começara a trabalhar, frequentava a Federação Espirita
nos domingos de manhã, depois almoçava um prato italiano na Rua Maria Paula em
São Paulo. A atividade que mais agradava era o futebol, tanto na televisão,
como nos campos de várzea do Ibirapuera e do Itaim. Nunca havia namorado, nem
flertado [termo da época], não sabia nem como abordar: - mulher não tinha
desejos, foi o que a família passou, ou o que deduzi, não sei?
Pelos
papos, a formação de meus amigos de futebol era semelhante. Certo dia José
[nome fictício] falou que iriamos conhecer uma boate. Que sua mãe, Da Irene
pediu que me convidasse. Sempre saia junto a este grupo familiar. Pedi
autorização a meus pais e aceitei. Poderíamos entrar na mesma sendo menores, o
nosso acompanhante era influente; senão, só com a maioridade.
Na casa
de José, junto com Dona Irene, era desquitada e saia com os filhos, e Beatriz a
irmã deste, alguns anos mais velha. Na verdade, eu admirava o modo dela andar
como uma garça pisando em ovos, era bonita e charmosa, lógico nunca me olhou.
Chegou Roberto, um senhor, de perto de quarenta anos, da classe média alta,
como todos nós, que após alguns tropeços em negócios havia recebido certa
quantia que estava investindo para voltar ao padrão da família. Era ele que
iria nos acompanhar e pagar as despesas.
De início
fomos até a Vila Buarque onde este queria mostrar seu grande negócio. Estava
confiante. Nos levou até um apartamento finamente decorado, com geladeira cheia
de petiscos importados e um bar com Uísque de várias marcas, todos
envelhecidos. Era uma confortável sala, com todos equipamentos da época e com
acesso a uma suíte montada com capricho. Não sei se era só este apartamento, ou
se havia outros no prédio. O grande negócio era alugar para encontros amorosos
de empresário por alto preço. Na época hotéis exigiam certidão de casamento
para casais, não existiam ainda Motéis e, estavam aparecendo timidamente os
Drives nos terrenos baldios, onde os automóveis estacionavam, faziam uma
consumação obrigatória e se viravam dentro do carro independentemente do
tamanho do mesmo. Certamente o negócio daria um bom retorno e o convite objetivava
propaganda na camada que poderia passar sigilosamente, de boca a boca o
empreendimento, ou seja, a mãe e a irmã de meu amigo. Na ocasião nada nos
ocorreu, nem a mim, nem a José.
Após
visitar o novo ramo de Roberto, nem sem antes degustar o uísque e os petiscos,
fomos a Av. Paulista para continuar a noite, Roberto era conhecido no local. O
nome da casa noturna me fugiu, ficava ao lado da Rua Augusta, quase na esquina,
em direção à Rua da Consolação. As mesas eram apertadas e as cadeiras estofadas
ficavam justas a elas. Como praxe muito escuro [ainda não havia nem luz negra,
nem estroboscópica nos estabelecimentos]. Um por um ocupou seu lugar; logo que
sentei notei algo diferente no chão, mesmo com a penumbra do local. Sempre tive
olhos de lince e dificilmente um objeto me escapa do olhar. Peguei, com certa
dificuldade, dado o exíguo espaço o objeto em questão. Era um maço de dinheiro.
- Alguém perdeu, pensei comigo. Poderia ser do Roberto ao passar para seu
assento ou de alguém que ocupara o lugar anteriormente, não contei a quantia,
dava para perceber que era um bom dinheiro e, não era meu.
Estava
com um grande problema: Se fosse de meu anfitrião poderia fazer-lhe falta, já
que todos carregavam dinheiro [não existiam cartões de crédito e raramente se
usavam cheques]; se acaso pertencesse ao cliente anterior ele deveria voltar
para procurar, o que parece que não aconteceu; se entregasse para o garçom dificilmente
ele repassaria ao dono. Ficar para mim, nem pensar, se chegasse em casa, onde
sempre o dinheiro foi controlado para fins educativos, com uma quantia alta era
encrenca na certa. Afinal não era meu dinheiro.
Após
muito pensar, cheguei ao Roberto:
- Acho
que seu dinheiro caiu e acabei de pegar no chão, tome-o!
- Você
quer pagar a saída que convidei? Falou indignado.
- Não!
Estava realmente no chão.
- Garçom,
bradou o Roberto, alguém perdeu dinheiro aqui hoje?
- Não,
seu Roberto, ninguém. Respondeu o garçom.
- Então
você está pagando, e muito mais que sua parte, com ar meio ofendido.
Dona
Irene interviu: - Deixa o menino, se ele quer pagar ou achou, tanto faz, aceita
e fim de conversa.
Ainda com
ar contrariado colocou o dinheiro na carteira.
Como a
casa estava meia vazia, Roberto achou por bem conhecer o Juan Sebastião Bar na
Vila Buarque que tinha sido inaugurado há poucos dias.
Nunca
mais vi o Roberto, hoje sei que ele ficou furioso pelo fato de eu estar
atrapalhando os planos de propaganda de seu novo negócio.
Creio que
ele se saiu bem no novo ramo.
Tony-poeta
20/10/15
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