sábado, 20 de outubro de 2012

O HIPERTENSO


O HIPERTENSO


 

José Tenório, o Tenório, estava aposentado há oito meses. Perdera a mulher dois meses antes e morava solitário. Sua casa estava vazia. Os três filhos mudaram por empregos melhores para a Capital e raramente o visitavam. Tinha quatro netos e Isabel esposa de Rafael esperava o segundo filho. Sua rotina era fazer alguma coisa para comer, bater um papo no armazém do Geraldo, às vezes jogar um dominó e ver televisão. Não tinha vícios.

Três meses antes de aposentar, quando da morte de esposa descobriu que tinha pressão alta. Chegou a 21 por 11. Colocaram até comprimido em baixo da língua no Pronto Socorro.  Fizeram eletrocardiograma, todos os exames e receitaram o remédio. Tinha que tomar de manhã e a noite um comprimido. Era isto que o estava deixando chateado. – Nunca tomei remédio nem para dor de dentes, agora vou tomar dois comprimidos por dia. Não se faz isto com Caboclo do Velho Chico.

Tentou não tomar o remédio. Parou novamente no Pronto socorro. Tentou tomar só pela manhã, ficou com dor de cabeça e dor na nuca. Teve que tomar como o médico mandou. Sempre revoltado tomava os comprimidos a contragosto.

O pior de tudo era cada três meses fazer nova consulta. Tirava a pressão, o médico perguntava sempre a mesma coisa e dava receita para três meses. Após este tempo tinha que voltar. Além dos comprimidos tinha este encheção de saco. Naquele mês não tinha marcado consulta e ficaria sem a medicação. Pensava:- Se não tomar alguns dias não vai fazer mal.

Foi neste dia que Rafael veio visitar de surpresa. Tivera uma folga e foi ver a doença do pai. Ficou bravo:

- Pai o senhor não é analfabeto. Trabalhou a vida toda em portaria falando com gente estudada, não pode fazer assim com a medicação. O vô morreu de enfarto pela pressão. Levou o pai a uma farmácia.

Comprou os três meses de remédio, mesmo sabendo que era de graça no centro de saúde. Viu em oferta aparelho de pressão digital:

- É fácil de medir a pressão? Perguntou ao atendente.

- Qualquer criança mede.

- Como é que faz?

- É fácil, eu ensino. É só colocar direito no pulso, apertar o botão e pronto: Tem a pressão e o pulso.

- Para que o pulso?

-Para ver se o coração está disparado.

Rafael comprou também o aparelho para o pai. Prometeu voltar assim que fosse possível.

Tenório começou a se entender com o aparelho. Pensou: se eu controlar bem, não tomo dois comprimidos por dia e levo mais tempo para voltar na consulta. Assim não tenho que ficar tomando estas porcarias.

A pressão subia, ele tomava o comprimido, mas não conseguia fica sem tomar a dose diária. Foi quando conversando com os vizinhos, Mané e Gertrudes, esta falou que banho quente, um pouquinho acima do morno abaixava a pressão e ajudava. Logo imaginou uma solução:

Tomaria o remédio às 10 ao invés das sete; depois do almoço começava a medir a pressão. Se estivesse alta, tomava um banho quente, a seguir media a pressão e só tomaria o comprimido se não tivesse jeito.

Deu mais ou menos certo. A pressão não ficava muito alta. Coisa de 17 por nove. Achou que estava bom. Depois do almoço começava a cada duas horas fazer o controle, alegava que não tinha nada para fazer, tomava o banho, media a pressão para ver quanto abaixou e, em duas horas repetia. Estava tomando menos remédio e não tinha que ir de três em três meses no médico. Chegava a tomar seis banhos diários.

Dia 17 chegou à conta de luz. Preparava-se para o banho. Foi até o quarto, tirou a roupa, pegou os óculos, e foi olhar a conta antes de entrar no banho. Era aniversário de morte do seu pai naquele dia. Morrera de enfarto na mesma idade que ele. Olhou a conta: Metade do seu salário.

-quatrocentos reais, falou ele, é um roubo. Mesmo tomando todos estes banhos. Nunca chegou a oitenta. Vai faltar dinheiro. O que vou fazer?

Começou a rodear a mesa pelado pensando uma solução, o dinheiro não ia dar. Como podia ser tão caro tomar banho?

Lembrou que o pai antes de ter o enfarto ficara muito nervoso. Tinha que se aclamar. Colocou os óculos. Olhou novamente a conta e, viu que o valor real era R$ 490,00. Para R$ 820,00 que ganhava não ia dar para comer.

Deu mais três voltas na mesa, completamente nu, nervos e enfartou morrendo na hora, que nem seu pai.

 

21/10/12

Tony-poeta

 

 

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário